Telegram é o app de mensagens que teve mais denúncias desse tipo em 2024; App passou a sinalizar e suspender alguns grupos e canais, mas não detalha as moderações que fez
Pesquisa realizada pela SaferNet aponta que o número de denúncias de grupos e canais contendo imagens de abuso e exploração sexual infantil no aplicativo de mensagens Telegram aumentou 78% entre o segundo e o primeiro semestre de 2024.
Relatório completo com os resultados da segunda análise realizada pela ONG em grupos e canais do Telegram cujos links foram denunciados à Central Nacional de Denúncias de Crimes Cibernéticos mantida pela SaferNet será divulgado nessa terça-feira (11), em São Paulo, no evento principal do Dia Internacional da Internet Segura no Brasil.
Este é o segundo relatório da SaferNet Brasil sobre o Telegram, realizado no âmbito do projeto DISCOVER, de prevenção da prática de abuso e exploração sexual infantil, e compreende a análise das denúncias recebidas no segundo semestre de 2024.
No relatório do segundo semestre, quatro indicadores tiveram aumento em relação ao número de links de grupos e canais do Telegram no primeiro semestre de 2024.
O número de grupos e canais do Telegram denunciados subiu para 1043 (aumento de 19%);
O número de grupos e canais que permanecem ativos sem moderação da plataforma subiu para 349 (aumento de 76%);
O número de grupos e canais contendo imagens de abuso e exploração sexual infantil que permanecem ativos, sem moderação da plataforma, subiu para 171 (aumento de 78%);
O número de usuários encontrados nesses grupos e canais subiu de 1,25 milhão para 1,4 milhão (aumento de 12%);
Somados os dois semestres de 2024, a SaferNet detectou 2,65 milhões de usuários em grupos e canais do Telegram contendo imagens de abuso e exploração sexual infantil.
No primeiro relatório, divulgado em outubro do ano passado, que analisou conteúdo denunciado no primeiro semestre de 2024, a SaferNet havia analisado manualmente 874 links de grupos e canais do app denunciados à ONG como “pornografia infantil”.
Do total denunciado no primeiro semestre, 215 grupos e canais do Telegram permaneciam ativos na plataforma, sem qualquer tipo de moderação, quando a pesquisa foi realizada.
Líder de denúncias
Entre os apps de mensagem, o Telegram lidera em número de denúncias de “pornografia infantil” recebidas pela SaferNet, por meio da plataforma www.denuncie.org.br. E, desde 2021, o Telegram está entre os 10 domínios com mais links desse tipo de crime denunciados à ONG.
Em 2024, o Telegram ficou em segundo lugar entre todos os domínios que a SaferNet recebeu denúncias. Em 2022 e 2023, o app ocupou a quinta posição no ranking geral de domínios com mais denúncias de “pornografia infantil” no Brasil.
Mudanças de postura
No final de setembro, um mês após a prisão de Pavel Durov, dono do Telegram, na França, em 24 de agosto de 2024, a empresa anunciou que estava colaborando com pedidos de autoridades entregando “alguns dados de usuários” (números de telefone e IPs) mediante requisições legais.
A divulgação do relatório de análise das denúncias de conteúdo criminoso no Telegram recebidas pela Safernet ocorreu em outubro de 2024. A empresa, que normalmente não respondia às demandas da imprensa brasileira, passou a emitir notas comentando os dados e diz ter removido 360 mil grupos e canais relacionados à exploração sexual infantil, mas a companhia não detalha como procedeu nesses casos.
Em janeiro deste ano, Pavel disse em depoimento à Justiça da França que não fazia ideia do tamanho da criminalidade no Telegram e prometeu melhorar a moderação de conteúdo criminoso na plataforma.
O Telegram também não participa da Tech Coalition, que estabelece protocolos rigorosos de transparência, inclusive a publicação de relatórios de moderação. Meta, Google, Apple e Microsoft participam da coalizão.
Segundo dados colhidos por pesquisadores e compilados na página Telegram Transparency Data, o Brasil estaria na quinta posição entre os países com mais requisições atendidas pela companhia. Não há informação, contudo, se os dados fornecidos foram suficientes ou permitiram avanços em investigações.
Sinais de moderação
Em 16 canais denunciados à SaferNet, por exemplo, a ONG encontrou sinais de ação da plataforma: uma mensagem alertava outros usuários que o grupo ou canal em questão estava “temporariamente suspenso para dar aos moderadores tempo para limpar os conteúdos e moderar os usuários que publicaram conteúdo pornográfico ilegal”. Ao menos 38 países no mundo possuem legislação obrigando plataformas digitais como o Telegram a reportar às autoridades sempre que souberem que hospedam conteúdo de abuso e exploração sexual infantil, segundo relatório do ICMEC nos EUA.
A SaferNet detectou que, além de atribuir aos moderadores de conteúdo supostamente criminoso a responsabilidade de “limpar os grupos”, o Telegram não tem um padrão de atuação. Numa pasta com 25 grupos chamada “Translation” (tradução, em português), apenas 8 grupos estavam sinalizados, mas a SaferNet localizou, manualmente, material de exploração sexual infantil em todos os outros grupos da pasta, cada um com 15 a 25 mil usuários.
O uso da expressão tradução para sinalizar esses grupos é uma velha tática usada por vendedores de materiais de exploração sexual infantil, que organizam e distribuem conteúdos criminosos como “traduções”, onde nacionalidades de vítimas são “idiomas”.
Parte dessas imagens de abuso e exploração sexual infantil são comercializadas no Telegram. Boa parte dos vendedores encontrados nos grupos denunciados à SaferNet aceitam como meio de pagamento as “estrelas,” a moeda virtual introduzida pela plataforma em junho de 2024.
O Telegram não possui registro no Banco Central do Brasil e utiliza 23 provedores de serviços financeiros para processar pagamentos, a maioria localizados na Rússia e na Ucrânia ou outros paraísos fiscais, como Hong Kong e Chipre. Quatro dessas plataformas de serviços financeiros sofreram sanções internacionais: YooMoney, Sberbank, PSB e Bank 131.
“Essas novas evidências comprovam a persistência dos riscos sistêmicos, a precariedade da moderação de conteúdo e a ausência de compliance da plataforma com a legislação brasileira de proteção à infância, combate à lavagem de dinheiro e financiamento do terrorismo. Os números da SaferNet evidenciam que o Telegram, sozinho, responde por 90,35% de todas as denúncias envolvendo aplicativos de mensageria realizadas no Brasil em 2023 e 2024”, afirma Thiago Tavares, presidente da SaferNet Brasil.
MPF e PF receberão novo relatório
Os novos desdobramentos da pesquisa da SaferNet serão encaminhados novamente ao Ministério Público Federal e para a Polícia Federal, assim como foi feito com o relatório do primeiro semestre, o que resultou na abertura de investigações.
A análise realizada pela Safernet foi feita no âmbito do projeto DISCOVER, de prevenção da prática de abuso e exploração sexual infantil. Neste projeto, apoiado pelo fundo Safe Online, a Safernet indexa palavras, acrônimos (siglas, abreviações, palavras codificadas ou com erros propositais de ortografia ou digitação) e emojis em português, inglês e espanhol usados por predadores sexuais ao organizar, divulgar, compartilhar ou trocar imagens de abuso e exploração sexual infantil e ou na tentativa de aliciar crianças e adolescentes a produzirem esses conteúdos.
A Safernet é uma organização não governamental de defesa dos direitos humanos na internet que existe desde 2005 e mantém a Central Nacional de Denúncias de Crimes Cibernéticos, que recebe denúncias de usuários da internet sobre 11 crimes. A central é conveniada com o Ministério Público Federal, que recebe apenas os links diferentes entre si e os analisa para verificar se há ou não indícios de crime. O canal de denúncias da SaferNet permite e garante o anonimato dos denunciantes, o que pode ser crucial, especialmente em casos de abuso sexual.
Texto publicado em 10/10/2025
Mais informações:
Assessoria de Imprensa
SaferNet Brasil
Marcelo Oliveira
11-98100-9521
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