As agências internacionais de classificação de risco fazem uma verdadeira chantagem ao país: “Ou aprovam a Reforma da Previdência ou haverá fuga de capitais”. O que está por trás desse discurso, repetido cotidianamente pelas principais emissoras de TV, é uma concepção que enxerga a Previdência como gasto supérfluo do governo.
Há interesses inconfessáveis do sistema financeiro que impõe uma agenda de corte de investimentos sociais, conforme Emenda Constitucional 95, que visa congelar as despesas por 20 anos. O que os bancos querem com a Reforma da Previdência são dois objetivos. O primeiro é que o governo demonstre que sobrará uma folga orçamentária para pagar os juros da dívida pública. O segundo é destruir o caráter público da Previdência para aproximá-la de um modelo de proteção individual, onde os clientes seriam estimulados a adquirir previdência privada.
Contudo, falta explicar à população que não há déficit na Seguridade Social. Há sim uma maquiagem contábil. Parte das receitas previstas na Constituição como PIS/COFINS, CSLL, percentual dos concursos de prognósticos, não tem sido devidamente repassados para Seguridade.
Além do mais, o próprio governo não tem um mecanismo eficiente de cobrança de grandes empresas devedoras. Sem falar que políticas de desoneração fiscal sempre utilizaram recursos da Previdência para beneficiar alguns segmentos de mercado.
Para piorar a situação, 30% do orçamento da Seguridade Social tem sido vítima da DRU (Desvinculação de Receitas da União), que serve como instrumento para realocar recursos e que desde os anos 90 tem servido para gerar superávit primário ou cobrir eventuais déficits. Trocando em miúdos, significa que quase 1/3 do Orçamento da Seguridade é desviado para cobrir despesas de outras áreas, notadamente o pagamento a bancos.
Os sistemas públicos de Previdência, no mundo, surgem como estratégia de enfrentamento aos infortúnios humanos e à pobreza. Baseada na ideia de solidariedade e na construção de uma proteção social coletiva, a Previdência representa um grande salto civilizacional.
Se cada cidadão tivesse que construir sua proteção individual, somente os mais ricos teriam condições de arcar com os custos. Imagine que se um trabalhador sofrer um acidente no primeiro dia de trabalho, ainda assim estará protegido. Trata-se de uma compreensão solidária
A Previdência, desde os Planos Beveridge (Inglaterra) e Bismarck (Alemanha), sempre foi pautada na compreensão de uma tríplice forma de custeio.
Assim também a Constituição Federal estipulou que trabalhadores, empregadores e governo, devem se cotizar para pagar o custeio. O próprio texto constitucional reconhece, portanto, que o governo deve fazer aportes com outros tributos, visando assegurar o equilíbrio orçamentário e atuarial dos Regimes Previdenciários.
É inaceitável, portanto, que o governo coloque a responsabilidade pelo suposto déficit nas costas dos trabalhadores, sem assumir que a principal responsabilidade é do próprio Estado brasileiro que não vem cumprindo o que preceitua a Constituição.
No debate sobre a Reforma da Previdência está implícita uma concepção de país. De um lado aqueles que defendem o Estado mínimo e preferem entregar ao mercado as decisões sobre o Brasil, do outro os que enxergam a Previdência como investimento social e instrumento para assegurar o cumprimento do Art. 3o da Constituição, que prevê como objetivos fundamentais da República erradicar a pobreza e diminuir as desigualdades sociais.
As propostas apresentadas pelo Governo Temer atacam direitos dos trabalhadores para preservar os interesses dos bancos e grandes corporações econômicas, em uma clara inversão de prioridades. É como se estivéssemos diante de uma família em crise que resolve cortar o remédio do vovô e a escola da criança, para sobrar dinheiro para o Whisky do pai.
Vamos resistir!
Augusto Vasconcelos
Presidente do Sindicato dos Bancários da Bahia, Advogado, Professor de Direito Previdenciário.
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