O ex-presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Sepúlveda Pertence, hoje advogado do ex-presidente Lula, afirmou, em defesa do pedido de Habeas Corpus preventivo junto ao Superior Tribunal de Justiça (STJ), que o cumprimento da pena antes de esgotados todos os recursos priva o condenado de um direito fundamental garantido na constituição: a presunção de inocência.
Essa é também a opinião do advogado criminalista e conselheiro federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), pela Bahia, Fernando Santana. Para ele não foi nenhuma surpresa que todos os ministros tenham seguido a posição do relator, Félix Fischer, o primeiro a negar o Habeas Corpus preventivo. O ministro ditou outras decisões de tribunais superiores, que sustentam que a análise de fatos e de provas termina, em tese, na segunda instância. “Tinha certeza de que a decisão seria essa, já que a mudança de paradigma já havia sido feita pelo STF”, afirma Fernando Santana, se referindo ao fato de que desde 2016 o STF entende que a prisão já pode ser decretada após a condenação em segunda instância.
Ainda sobre a tese de que a análise de fatos e de provas termina na segunda instância, o advogado criminalista argumenta que existem questões de direito que podem repercutir contra o conteúdo da própria decisão condenatória e anulá-la, independentemente de estar examinando prova ou não.
Chama a atenção o que Fernando Santana intitula de “onda punitivista”: punir a qualquer preço, sem que haja a garantia de direitos individuais. Isso porque a decisão do STF em 2016 foi uma declaração que aconteceu no julgamento de um caso isolado e não tem força de súmula vinculante, quando todo Tribunal tem que cumprir. Mas é isso que vem acontecendo, o que para o conselheiro federal significa dizer que o Supremo reescreveu a Constituição Federal. “Do ponto de vista material e formal, o trânsito em julgado como categoria jurídica está assentado e pacificado, tanto na doutrina, como na jurisprudência. Não preocupa o nome a quem se negou o habeas corpus. Preocupa a violação do princípio constitucional da presunção de inocência e de não culpabilidade”. De acordo com esse princípio ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória, que inclui os recursos especial e extraordinário, junto ao STJ e STF, respectivamente.
Se não se esgotam todas as certezas possíveis em relação à sentença, a dúvida favorece o réu. É o in dubio pro reo, princípio do processo penal que em latim significa, literalmente, “na dúvida, em favor do réu”. O que é um retrocesso na garantia dos direitos fundamentais do cidadão. “Minha pergunta é: Quem vai devolver esses dias de liberdade àqueles que foram cumprir pena antecipadamente e depois tiveram a sua situação processual revista?”, levanta a questão.
Ontem (06/02) o Superior Tribunal de Justiça negou por unanimidade o pedido da defesa para evitar que Lula seja preso após a condenação em segunda instância. Isso deve acontecer quando se esgotarem todos os recursos junto ao Tribunal Regional Federal da Quarta Região, que confirmou a condenação do ex-presidente no caso do triplex do Guarujá. Com o Habeas Corpus preventivo negado, a defesa do ex-presidente Lula ainda pode recorrer na própria turma do STJ com embargo de declaração, um recurso que serve para tirar dúvidas sobre a decisão. O resultado só do julgamento só pode ser revertido pelo STF caso a defesa apresente esse pedido.
A defesa de Lula pressiona para que o STF reveja a posição. A presidente do Supremo, ministra Carmen Lúcia, já declarou que não vê motivo para rediscutir a questão apenas dois anos após o entendimento já firmado. Carmen Lúcia não tem pautado o tema, apesar da pressão de advogados de defesa, partidos políticos e até de alguns ministros da Corte. “Parece-me que é uma opção condicionada pelo nome de alguém na capa de um certo processo, Lula, esquecendo que a solução interessa à cidadania brasileira. O que apequena o STF é a série de decisões monocráticas de vários ministros do próprio Tribunal e que desafiam a prevalência da mudança do paradigma de interpretação da cláusula constitucional de respeito ao trânsito em julgado da sentença penal condenatória”, conclui Fernando Santana.