Rosa Maria Egipcíaca da Vera Cruz é certamente a mulher negra africana do século XVIII, tanto em África como na diáspora afro-americana e no Brasil, a respeito de quem se dispõe mais detalhes documentais sobre sua vida, visões, escritos e paixão. É a primeira escritora afro-brasileira, cujo livro com 250 páginas, “Sagrada Teologia do Amor de Deus Luz Brilhante das Almas Peregrinas”, foi queimado antes de ser presa pela Inquisição, do qual restaram algumas páginas manuscritas.
Dos seus 52 anos de fantástica existência, viveu 20 anos no Rio de Janeiro e 18 anos seguidos em Minas Gerais. Foi considerada na época como “a maior santa do céu”, a quem brancos, mulatos e negros, inclusive toda a família de seu ex-senhor e respeitáveis sacerdotes, adoravam de joelhos, beijando-lhe os pés, venerando suas relíquias, intitulando-a “a flor do Rio de Janeiro”. Fundou o Recolhimento de Nossa Senhora do Parto, ocupado predominantemente por negras e mestiças ex-prostitutas, cuja capela, reformada, permanece até hoje no Centro desta cidade na rua da Assembléia. Melhor que ninguém, Rosa tipifica a riqueza e força do sincretismo religioso católico afro-brasileiro. Todos os detalhes de sua vida encontram-se em três processos e dezenas de cartas conservados na Torre do Tombo em Lisboa, manuscritos descobertos pelo Prof. Luiz Mott da UFBa, divulgados no livro Rosa Egipcíaca: Uma Santa Africana no Brasil, 650 páginas, 2ª Edição, Editora Companhia das Letras, (R$160,00), com tarde de autógrafos e conversa com o autor no dia 3 de junho, sábado, 17hs, Shopping Bela Vista, Livraria LDM.
Rosa era uma negrinha nascida na Costa de Mina, de nação Courana, , que desembarcou de um navio negreiro no Rio de Janeiro, em 1725: tinha 6 anos de idade, batizada na Igreja da Candelária. Aos 12 anos foi “desonestada” pelo seu proprietário e vendida para as Minas Gerais, onde viveu como prostituta numa fazenda com 70 escravos homens e só ela de mulher. Aos 40 anos começou a ser atribulada por sete demônios que só se acalmavam com os exorcismo de uma sacerdote português conhecido como “Xota Diabos”. Converteu-se em piedosa beata, distribuindo todos seus bens aos pobres, tendo visões celestiais e profetizando o futuro. Considerada embusteira pelo Bispo de Mariana, foi severamente açoitada no pelourinho, fugindo juntamente com seu padre exorcista para o Rio de Janeiro, onde suas visões se tornaram cada vez mais frequentes e sofisticadas, exatamente como acontecia com outras santas barrocas no Velho Mundo. Foi a grande vidente dos Sagrados Corações. Com apoio do Bispo e de padres seus devotos, funda então o Recolhimento de Nossa Senhora do Parto, no Centro histórico do Rio de Janeiro, acolhendo uma dezena de pretas e mulatas ex-prostitutas. Previu um novo dilúvio, castigo divino contra os pecadores da Colônia, somente se salvando quem estivesse em seu recolhimento que como nova Arca de Noé iria navegar até o Reino de Portugal onde se casaria com D. Sebastião, o Venturoso, desaparecido há século nas areias do Marrocos. Dessa união nasceria um novo Messias mulato redentor da humanidade. Presa pela Inquisição, confirmou sempre que todas suas visões e êxtases eram verdadeiros. Morreu de morte natural nos cárceres secretos da Inquisição de Lisboa em 1771 aos 52 anos. Sua vida foi enredo da Escola de Samba Viradouro, sendo vice campeã do Carnaval de 2023.