A criminalização dos paredões não resolve o problema da segurança nas periferias
A falência do sistema de segurança pública no Brasil se manifesta mais uma vez. É notório o despreparo das autoridades e a falta de criatividade para lidar com assuntos contemporâneos e que fogem da gestão tradicional e ultrapassada que delineou as políticas ao longo dos tempos. Tudo que o Estado e a Sociedade não conseguem dialogar, automaticamente vira crime. É a forma mais covarde de enfrentar os desafios colocados à frente.
O episódio de ontem, em que uma pré-adolescente morreu após ser atingida por tiros e outras oito pessoas foram baleadas, na cidade de Lauro de Freitas, reascendeu o debate sobre a proibição dos paredões. E nem estamos falando aqui da opinião da polícia, por ela, tudo seria proibido nas periferias, inclusive ir à praia em grupos de quatro ou cinco.
Me preocupa realmente é a postura de algumas autoridades políticas e até agentes culturais que reproduzem esse discurso, sem ao menos tentar fazer uma leitura mais aprofundada do tema. Basta olhar para o retrovisor da história para percebermos que esta estratégia da criminalização já foi utilizada para inibir a prática do candomblé e da capoeira. Proibiram a produção e comercialização do acarajé. Tentaram proibir e criminalizar o funk e o relezinho e será assim com tudo que for afro-contemporâneo.
Os paredões foi o que restou de entretenimento e lazer para as periferias. Ir ao shopping e ao cinema está cada vez mais caro. Frequentar a praia de Stela Mares em grupos de cinco é fazer parte de facções. Sobra então, fazer de nosso quintal o nosso parque. Som na caixa.
Os paredões têm sim, muito a ser debatido. Tenho também às minhas críticas. Não curto as músicas que expõem e desvalorizam a mulher, por exemplo. Mas, ao contrário de proibir, penso em disputar esses espaços. Intervir de forma positiva, propor de forma construtiva um debate qualificado sobre resgate cultural e cultura contemporânea.
O Dr. Vilson Caetano, antropólogo e presidente da Associação Oba Lokê, afirma que o termo paredão é resultado de uma conquista da juventude negra. Ele explica que a juventude ressignificou o conceito de paredão, que num passado bem recente era sinônimo de execução, extermínio, morte e que essa juventude traduziu para entretenimento, lazer e diversão.
Esses meninos e meninas que frequentam os paredões, ao contrário de nós, adeptos do “proibitismo”, estão abertos e ávidos por novidades, ainda que essas novidades sejam novidades centenárias.
Vamos nos aproximar dos paredões, investir neles, “normatizá-los”. Se a parte que se julga “boa” da sociedade se afasta de um movimento como esse, a tendência natural é que outras “forças” se aproximem e deem direção a essa juventude que somente quer viver.
Por: Ricardo Andrade