Abusando da inteligência dos brasileiros, Temer definiu hoje sua proposta de reforma trabalhista como “um belíssimo presente de Natal”. Para os empregadores, certamente. Para os trabalhadores, um presente de grego. Na medida em que “o negociado prevalecerá sobre o legislado”, as categorias mais fracas, com baixo nível de organização e capacidade de pressão, aceitarão dos patrões a imposição de condições de trabalho massacrantes, com jornadas de trabalho que poderão chegar a 12 horas diárias.
Disposto a baixá-la por medida provisória, Temer recuou a conselho dos próprios aliados. A Câmara, que acaba de refugar a imposição de cláusulas pesadas aos estados endividados, poderia recusar a medida na admissibilidade. Não se tratada de nada relevante e urgente. Enviada como projeto de lei, a reforma não tem prazo para ser aprovada e tramitará no ano crucial para a sobrevivência de Temer, com deputados e senadores já se orientando pelo humor do eleitorado com quem acertarão contas em 2018.
A proposta atende a antigo pleito do empresariado para aumentar a mais-valia que tiram dos trabalhadores, ora apelidada de produtividade. São 12 direitos que poderão ser “negociados” com os empregadores. As férias anuais de 30 dias, por exemplo, poderão ser parceladas em até três períodos, sendo que um deve ter pelo menos duas semanas. Adeus férias corridas para uma viagem ou a solução de um problema pessoal. Mas o pulo do gato está na jornada de trabalho, hoje de 44 horas semanais e não mais que oito horas diárias. Segundo o projeto, poderão elas ser de até 12 horas e no máximo 220 horas mensais. Imagine-se o que sobrará para dormir para os trabalhadores que moram longe do trabalho e dependem do precário transporte público em nossas metrópoles. O detalhe está no intervalo mínimo de 30 minutos entre uma jornada e outra. Isso significa que um patrão poderá exigir, em certos momentos, jornadas duplas de 12 horas com pequena pausa entre elas.
Poderá ainda ser negociada a extensão do acordo coletivo do ano anterior enquanto o novo dissídio não se conclui. Esta regra vale hoje mas se a extensão for suspensa, direitos conquistados deixam de valer e os patrões podem endurecer, prolongando o fechamento de um novo acordo por quanto tempo quiserem.
Até mesmo o seguro-desemprego poderá ser negociado, vale dizer, empregados pressionados podem abrir mão deste direito para conseguir uma colocação ; Os planos de cargos e salários, acréscimos superiores a 50% nas horas extras, a remuneração por produtividade, o trabalho remoto e o registro de ponto entram também na roda. São preservados, não podendo ser negociados, o 13º. Salário, o salário-família, os 50% sobre horas extras, a licença-maternidade e o aviso prévio. Mas aí já seria crime, pois são direitos garantidos pela Constituição.
Este é o “belíssimo presente de Natal” que Temer diz estar oferecendo. Um presente que permite aos patrões, em tempo de desemprego elevado, impor condições com ameaças de demissões. Será simples. A cada renovação do acordo coletivo de categorias mais organizadas, eles baterão na mesa. Ou aceitam ou muita gente irá para a rua. Já com as categorias desorganizadas e dispersas, será simples como tomar doce de criança. Bastará ao patrão dizer, na hora de contratar: é pegar ou largar. Quem está sem salário aceitará qualquer coisa.