Deu-me engulhos a mais recente coluna dominical do jornalista Elio Gaspari na Folha de São Paulo deste domingão, apesar de ele ter divulgado uma teoria que faz todo sentido.
Gaspari é daquele tipo de jornalista que conta uma parte maior da verdade para desarmar o leitor para a distorção dos fatos que fará logo em seguida.
A coluna já inicia com uma afirmação repugnante, simplista, bem ao gosto de qualquer energúmeno fã da ditadura militar. Leia o primeiro parágrafo:
“Lula pode ser candidato em 2018 (ou em 2017), mas namora-se a ideia da sua inelegibilidade. Jogo arriscado, porque o papel que ele desempenha com maior brilho é o de coitadinho perseguido pela elite(…)”
É preciso estômago. Papel de coitadinho? Vamos ver se é isso mesmo. Por enquanto, fiquemos com o fato de que Gaspari está certo quanto ao plano de anular Lula para ele não poder disputar uma eleição, como se não fosse possível ele influenciar na eleição mesmo tendo sido inabilitado pelo cárcere ou por leis tornadas “adequadas” ao seu caso.
E Gaspari continua:
“Os depoimentos de empresários que compraram políticos igualaram os prontuários de notáveis, consolidando a ideia de que são todos farinha do mesmo saco. O PSDB, com sua vestes angelicais e processos que claudicam na Justiça (como o do cartel das obras do metrô e das ferrovias) paga o preço de ser parte do atual governo”.
Outra dose de sinceridade, tudo para compensar a história de que Lula se dá bem no papel de “coitadinho”. Aliás, a tese de Gaspari nada mais é do que uma versão da tese de outro colunista da Folha, Reinaldo Azevedo. Ambos acham que os abusos reiterados da imprensa e da Lava Jato contra o petista levam água para o seu moinho. E estão certos.
E, nesse contexto, a condução coercitiva do pastor-picareta Silas Malafaia na semana passada trabalhou no sentido de mostrar uma espécie de “justiça divina” agindo em favor de Lula
Mas a minha parte favorita da coluna em questão é a seguinte:
“(…) Com a entrada do PMDB na ciranda da Lava Jato e com o mau desempenho da economia, Lula cimentou sua posição de coitadinho. Num primeiro momento ele poderia ser condenado pelas malfeitorias em que se meteu. Aos poucos, fica a impressão de que se busca a condenação para obter a inelegibilidade, uma versão elegante do banimento. Na Argentina, com Juan Perón, deu no que deu No Brasil, o banimento de Leonel Brizola por 15 anos terminou com sua eleição para o governo do Rio de Janeiro em 1982. Por puro exercício do raciocínio, admita-se que a eleição será em 2018 e Lula estará inelegível. Como a jararaca não terá morrido, poderá apoiar uma nova versão de seus postes (…)”.
É bem por aí. Gaspari é inteligente, assim como Azevedo. Já entendeu que o massacre de Lula é tão ousado, tão descarado, tão parcial, tão injusto que vai revoltando cada vez mais gente.
Esse pessoal vive agora se achando expert em política. Temer chegou ao ponto de chamar aquele bando de tarados do MBL para lhe dar “consultoria política”.
Essa gente é tosca. Está surfando no desespero da sociedade por de repente começar a perder tudo de bom que ganhou do PT ao longo de 11 anos do seu governo de 13. Mas vai encontrar seu pagamento logo ali adiante. Eles não perdem por esperar…
Mas esse texto é sobre as acusações a Lula. Já notaram que ele é acusado não por patrimônio suspeito que tem, como é o caso de um corrupto clássico como Eduardo Cunha, por exemplo, mas por patrimônio que não tem, mas dizem ser dele?
Até há uma semana, Lula era acusado de ser o “chefe supremo” de um esquema criminoso por ser o suposto proprietário oculto de um apartamento no Guarujá e um sítio em Atibaia (?!!).
Depois, como realmente parece ser muito pouco patrimônio para alguém ocultar, arrumaram um terreninho ao lado do Instituto Lula e um apartamento ao lado daquele no qual reside.
Poucos se deram conta dessa “coincidência”: os dois novos supostos imóveis ocultos de Lula são “grudados” fisicamente a imóveis que ele já possui. Algozes do ex-presidente pretendem substituir a lógica pela proximidade física.
No caso do “tríplex” e do sítio em Atibaia, que já estão aí há muito tempo sem jamais ter surgido uma mísera prova de que pertencem ao ex-presidente, somados os imóveis chegam a cerca de dois milhões de reais – pouco mais, pouco menos.
Sim, é isso mesmo: DOIS MILHÕES DE REAIS são quanto custam o tríplex e o sítio em Atibia que constituiriam prova de que Lula seria o “líder supremo” de uma poderosa “organização criminosa” que roubou CENTENAS DE BILHÕES DE REAIS.
O mais incrível é que a renda de Lula seria mais do que suficiente para comprar esses e muitos outros imóveis. Além de sua aposentadoria como presidente ser mais de trinta mil reais, ele tem outras rendas absolutamente legais, como aposentadoria por ser vítima da ditadura etc.
Além disso, alguém consegue dizer, sem ruborizar, que um ex-presidente que deixou o cargo da então 6ª maior economia do mundo com 80% de aprovação não conseguiria dar palestras bem-remuneradas pelo mundo afora?
Vão se catar!
Fernando Henrique Cardoso entregou a economia brasileira com cerca de 13% de desemprego e outro tanto de inflação, sem reservas cambiais e afundado em impopularidade e ninguém questionou as palestras que passou a dar após sair do cargo; já Lula, que deixou o país sem inflação e desemprego e com quase 400 bilhões de reservas, montado em 80% de popularidade, não poderia ser remunerado para explicar o êxito de seu governo.
Mais uma vez, vão se catar!
Só a aposentadoria de Lula como presidente já seria suficiente para comprar os imóveis em questão.
O tríplex custa cerca de um milhão e duzentos mil reais, o sítio em Atibaia custa cerca de oitocentos mil reais. Uma pessoa com renda oficial que pode chegar a sessenta ou setenta mil reais, ou mais, não pode comprar dois imóveis que somados custariam uns dois milhões?
Para que o ex-presidente arriscaria destruir sua biografia por patrimônio tão pequeno? Como um homem que teve inteligência para sair de onde saiu e chegar aonde chegou seria tão burro a ponto de arriscar tanto por tão pouco?
A direita não quer saber. Acha que consegue vender qualquer tese, hoje em dia. Está errada de novo. Conseguiu porque Dilma se reelegeu. Se não tivesse sido reeleita, estaria muito forte e os tucanos (Aécio) é que estariam em maus lençóis.
Teria sido muito mais inteligente deixarem Dilma sangrando até 2018 e ganharem a eleição presidencial limpamente. Porém, a sede de poder falou mais alto. E a estupidez dos gorilas de direita fez o resto do serviço.
Por tudo isso, acreditem: Lula, preso ou morto, vira mártir; solto, vira presidente.
Se não puder se eleger, sua mera trajetória de vida e seu governo de oito anos vão fazer o povo votar em quem ele indicar ou em quem seus herdeiros políticos indicarem.
Quem viver, verá.