“Desilusão, desilusão…” O samba Dança da Solidão, do grande Paulinho da Viola, cantado pela grande Marisa Monte, seria um fundo musical perfeito para estes estranhos tempos. Poderíamos chamá-lo de “leitmotiv” da nossa desesperança, se quiséssemos ser bestas. A desilusão começou quando? Dá para escolher. No fim da ditadura que o Bolsonaro diz que nunca existiu, quando Tancredo ia tomar posse como o primeiro presidente civil em 20 anos, mas os germes hospitalares de Brasília tinham outros planos? Depois viria o entusiasmo seguido de grande frustração com Collor, o Breve, tão bonito, tão moderno, tão raso, a desilusão com o PT e a desilusão com os políticos em geral, agravada com as revelações de que até grão senhores da República levavam bola.
Por falar em escândalos… O samba do Paulinho também tem um verso que, ligeiramente adaptado, nos diz respeito. “Quando eu penso no futuro, não esqueço o passado.” Se essa eleição presidencial por grande maioria provou alguma coisa é que nosso passado não tem mais nenhuma relevância política. A ditadura foi esquecida, até os generais estão voltando. Bolsonaro pode ter razão, a ditadura pode nunca ter acontecido, o golpe de 64 pode ter sido apenas um movimento de tropas, como disse o Toffoli.
Foi tudo um delírio, vamos esquecê-lo. Rubens Paiva, Stuart Angel, Vladimir Herzog, Manoel Fiel Filho e as centenas de supostos desaparecidos podem voltar. Acabou a farsa. E façam suas apostas: o que vai ser esclarecido primeiro, o caso da bomba no Riocentro, do qual nunca se ouviu mais nada, ou o caso da Marielle, que também não?
Luis Fernando Verissimo do site Carta Capital
* Publicado originalmente n’O Estado de S. Paulo