_Objetivo é reter o dinheiro nos municípios, estimulando a economia local e geração de renda_
Crédito: Ricardo Filho/Ascom Setre
O governo federal, por meio dos ministérios do Trabalho e Emprego (MTE) e Desenvolvimento Social (MDS), está discutindo com a Caixa Econômica Federal (CEF) o pagamento de benefícios sociais, como o Bolsa Família, que movimenta cerca de R$ 170 bilhões/ano, através dos bancos comunitários, que são organizações sem fins lucrativos que operam com moedas sociais e integram o rol de atores das chamadas finanças solidárias.
A informação foi dada pelo diretor de Parcerias e Fomento da Secretaria Nacional de Economia Solidária (Senaes), Fernando Zamban, nesta sexta-feira, 09, durante conferência no Brasil Nordeste – 1 Festival de Economia Popular e Solidária do Nordeste. O evento acontece até este domingo, 11, no Centro de Convenções de Salvador.
“Estamos discutindo internamente com a Caixa Econômica e o MDS, a estrutura de pagamento de benefícios sociais por meio dos bancos comunitários”, disse Zamban, sem entrar em detalhes, confirmando, porém, que o diálogo está avançado.
O objetivo é estimular o desenvolvimento da microeconomia nas regiões e nos bolsões de pobreza, no interior dos estados, sobretudo nas regiões do Nordeste e Norte do País. A medida seria uma forma de reter o dinheiro nos municípios e gerar renda para a população, uma vez que a moeda social que circula nos bancos sociais é aceita no território onde está inserida, o que fortalece o comércio local.
A implementação começaria em uma parcela pequena de municípios para depois se estender aos demais que já possuem bancos comunitários. As finanças solidárias, que surgiram de iniciativas comunitárias populares, funcionam a partir de quatro atores: bancos comunitários, moedas sociais, fundos solidários e cooperativas populares de crédito.
Segundo Zamban, a ideia é integrar esses mecanismos para estruturar o Sistema Nacional de Finanças Solidárias, e uma das principais ações seria a do pagamento dos benefícios sociais do governo por meio deste modelo financeiro.
O principal deles, o Bolsa Família, que só em 2024 transferiu quase R$ 170 bilhões a mais de 20 milhões de famílias, já contempla, na Lei que o rege, a autorização para que Caixa Econômica Federal utilize o que foi chamado de “arranjos locais de pagamento”, onde se enquadra a figura do banco comunitário. Zamban não informou onde seria iniciado o projeto tão logo o martelo seja batido.
*Iniciativas* – As finanças solidárias não são novidade. Atualmente são 182 bancos comunitários no País e 250 mil brasileiros que utilizam moedas sociais e mais de 30 mil comércios cadastrados que aceitam moedas sociais de acordo com a Rede Brasileira de Bancos Comunitários.
A Bahia, por exemplo, já conta com 10 bancos comunitários (em 10 municípios ou localidades) e suas respectivas moedas sociais. A política de finanças solidárias no estado integra ações da Secretaria do Trabalho, Emprego, Renda e Esporte da Bahia (Setre), por meio da Superintendência de Economia Solidária e Cooperativismo. O secretário da Setre, Augusto Vasconcelos, acredita que fortalecer o segmento é fundamental para gerar renda nos municípios.
“Temos iniciativas importantes de bancos comunitários, moedas sociais, fundos rotativos, que têm ajudado a alavancar os empreendimentos, gerando renda para diversas comunidades. Também estamos expandindo o microcrédito do governo do estado, o CrediBahia, assinamos mais de 220 termos de cooperação com municípios e emprestamos mais de 700 milhões de reais desde o início do programa para pessoas que não teriam acesso a crédito em bancos tradicionais, o que impulsiona a distribuição de renda”, diz Vasconcelos.
A injeção de recursos e movimentação financeira nos bancos comunitários, com o pagamento de benefícios sociais, como o Bolsa Família, que transfere cerca de R$1,6 bilhão para o estado, permitiria um salto na melhoria das economias locais e na diminuição da pobreza.
*Sistema estadual* – A articulação nacional também conta com iniciativas estaduais e municipais. O Governo da Bahia, por meio da Setre, está prestando assistência técnica às organizações comunitárias para elaboração do Sistema Integrado de Finanças Solidárias.
O coordenador de microcrédito e finanças solidárias da Setre, José Paulo Crisóstomo, explica que a criação de uma Cooperativa de Crédito Solidária será elemento central no sistema efetuando a interface entre bancos comunitários, fundos rotativos, Oscips de microcrédito e uma plataforma digital, a e-dinheiro.
“O que muda é que os bancos comunitários, por lei, não podem captar recursos e dependem de editais. Com a figura da cooperativa no sistema, bancos poderão captar e ampliar o alcance do sistema de finanças solidárias. Isso muda tudo e possibilita a realização de sonhos e de inclusão através do empreendedorismo solidário”, diz Crisóstomo.
*Crescimento -* Em 2024, cerca de R$ 1 bilhão circularam no País em moedas sociais, diz o presidente da Rede Brasileira de Bancos Comunitários, Joaquim Melo, que participou da conferência sobre finanças solidárias durante o Festival de Economia Solidária nesta sexta-feira, 09. Ele foi o fundador do primeiro banco comunitário do País, em 1998, o Banco Comunitário Palmas, no Ceará, a partir do qual surgiu a primeira plataforma digital comunitária de bancos, a e-dinheiro, que também será usada no sistema da Bahia.
“Importante saber é que a moeda social é lastreada em reais. Então, eu tenho um cartão, como se fosse um cartão pré-pago, que chamamos de moeda social porque é circunscrita à uma determinada região. Um prefeito, por exemplo, pagou o salário de um funcionário. Eu pego esse dinheiro e coloco no cartão. A moeda social hoje está digitalizada através de uma plataforma nacional comunitária que é a e-dinheiro que a gente criou no banco Palmas, mas serve para todo mundo. Só funciona no município onde funciona a moeda social. E quando quiser transformar, ou converter, em reais, ele clica lá ‘quero converter’ e coloca em uma conta de um banco comercial qualquer. Mas o importante é que a moeda social fica no município e gera renda local. É a economia de baixo para cima”, explica.
Diversos municípios também estão criando bancos comunitários, com suas devidas moedas sociais. “O banco e a moeda são criados por Lei Municipal e o prefeito paga as contas do município, fornecedores, programas sociais, fazendo com que todo o dinheiro circule ali”, diz Melo.
Um exemplo exitoso é do município de Indiaroba, interior de Sergipe. O ex-prefeito da cidade, responsável pela criação do Banco Popular de Indiaroba, cuja moeda é o Aratu, conta que 321 empreendedores estão cadastrados e já realizaram 64 mil operações financeiras solidárias. São mais de 3.300 contas abertas ativas.
“Deixamos de ter pessoas pedindo uma cesta básica que fosse, para ver o município ampliar o comércio e a distribuição de renda”, conta Adinaldo. Para ele, a solução financeira para os municípios do interior é o engajamento nas finanças solidárias.
O desafio hoje para ampliar essa prática, diz Joaquim Melo, é efetivar a criação do Sistema Nacional de Finanças Solidárias. “Se a gente conseguir pagar, nem que seja 10% do Bolsa Família, só nos municípios onde já tem bancos comunitários ou municipais, geraria milhões para reinvestir no próprio território, desenvolver localmente, gerar empregos e empresas locais, oferecer crédito a juro baixíssimo”.
*Regina Bochicchio/Ascom Setre*
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