A matéria postada neste blog com o título “Ives Gandra Filho: O Opus Dei no STF?” gerou certa polêmica. Alguns internautas escreveram rejeitando a insinuação, afirmando que o pai, sim, pertence à seita oriunda do franquismo espanhol – não o filho. Neste sábado (28), porém, a Folha de S.Paulo – que conhece melhor os porões destas organizações fascistas – resolveu a pendenga numa minúscula notinha: “Caso seja nomeado para o Supremo, Ives Gandra Filho não será o primeiro adepto da Opus Dei na corte. O ministro José Geraldo Rodrigues de Alckmin, tio do governador de SP, ocupou o posto de 3 de outubro de 1972 a 6 de novembro de 1978”.
O jornal da famiglia Frias – que apoiou a ação de grupos fascistas durante a ditadura militar e alojou nas suas redações vários policiais, tanto que ganhou o título de veículo de maior “tiragem” no país não pelo número de exemplares, mas sim pela quantidade de tiras – até poderia dar mais detalhes sobre a trajetória de Ives Gandra, do filho cotado para ocupar a vaga de Teori Zavascki no STF e também do governador Geraldo Alckmin. Mas aí já seria pedir demais à Folha. O importante é que ela confirmou que Ives Gandra Filho é “adepto do Opus Dei”. Sobre esta seita e seus seguidores fanáticos, reproduzo abaixo três artigos postados neste blog em meados de 2006:
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Alckmin: o candidato do Opus Dei
Em recente sabatina na Folha de S.Paulo, o candidato Geraldo Alckmin foi curto na resposta: “Não sou da Opus Dei. Respeito quem é, mas não a conheço”. Os jornalistas deste órgão de imprensa, que se jacta de “não ter o rabo preso”, nada mais perguntaram, talvez porque já satanizaram Lula ou temam o poder divino desta seita religiosa. No caso, o ex-governador mentiu descaradamente ao dizer que não conhece o Opus Dei (em latim, Obra de Deus) ou seus fanáticos. Uma reportagem bombástica, publicada na revista Época em janeiro de 2006 e que depois desapareceu misteriosamente do noticiário da mídia, deu provas cabais de que atual presidenciável é um fiel seguidor desta organização católica de cunho fascista.
“Alckmin é um dos políticos brasileiros com ligações mais estreitas com a Obra. Elegeu Caminho, o guia escrito pelo fundador Josemaría Escrivá, como o seu livro de cabeceira. ‘Acostuma-se a dizer que não’, é um dos ensinamentos que mais aprecia, conforme contou em entrevista à imprensa. Um popular sacerdote do Opus Dei, o padre José Teixeira, foi seu confessor. Nos últimos anos, Alckmin tem recebido formação cristã no Palácio dos Bandeirantes de um influente numerário, jornalista Carlos Aberto Di Franco”, relata o artigo. Numerário é o adepto da seita obrigado a residir nos sinistros casarões da Obra, ser virgem e usar o cilício nas cochas (corrente com pontas) e chicotear as costas. Já o supernumerário pode até frequentar a Daslu, antro de consumo da elite brasileira, e tem a missão divina de conquistar prestígio na sociedade.
A conversão na ditadura
Ainda segundo a reveladora matéria escrita por Eliane Brum e Ricardo Mendonça, a reunião semanal do Opus Dei “é chamada informalmente de Palestra do Morumbi, numa alusão ao bairro onde se localiza a sede do governo. Alckmin e um grupo de empresários, advogados e juristas recebem preleções de cerca de 30 minutos… Um dos participantes do encontro, o desembargador aposentado e professor de direito da USP, Paulo Fernando Toledo, diz que o governador tucano é um dos ‘alunos’ mais aplicados. ‘Ele toma nota de tudo’. Outro membro do grupo, José Conduta, dono da corretora Harmonia, relata que Alckmin não faltou a nenhuma reunião, mesmo quando disputava a reeleição em 2002”.
O grau de detalhamento da reportagem não deixa margem a dúvidas – e confirma que o candidato tucano mentiu no convescote da Folha. Ela chega a listar outros influentes participantes da Palestra do Morumbi: João Guilherme Ometto, vice-presidente da Federação das Indústrias de São Paulo, Benjamin Funari Neto, ex-presidente da Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica, e Márcio Ribeiro, ligado à indústria têxtil. Segundo revela, “os laços do governador com o Opus Dei iniciaram-se com a família. Seu tio, José Geraldo Rodrigues Alckmin, ministro do Supremo Tribunal Federal indicado ao cargo pelo então presidente, general Emílio Garrastazu Médici, foi o primeiro supernumerário do Brasil”.
Inspirado por Escrivá
As ligações de Geraldo Alckmin com esta seita ultrassecreta já eram motivo de especulações há tempos, mas só adquiriram veracidade com a reportagem da Época, ela mesma decorrente do sucesso do livro “O Código da Vinci”, do estadunidense Dan Brown, que desnudou seus mistérios. Em setembro de 2000, o repórter Mario César Carvalho já havia dados algumas pistas. Revelou que o pai de Alckmin “adquiriu o perfil erudito numa organização católica da qual fazia parte, o Opus Dei, criada em 1928, e que tem um viés político de direita – na Espanha, apoiou a ditadura de Francisco Franco. Em 1978, no cinqüentenário do Opus Dei, o pai de Geraldo Alckmin pediu ao filho [prefeito da cidade] que batizasse com o nome do fundador uma das ruas de Pindamonhangaba: Josemaría Escrivá de Balaguer y Albas. Assim foi feito”.
Outro jornalista, Mário Simas Filho, também fez uma surpreendente descoberta. Num artigo à revista IstoÉ, de dezembro de 2003, descreve: “Quando completou 24 anos, em 7 de novembro de 1976, Geraldo Alckmin estava angustiado. Ele sonhava ser médico, cursava o quinto ano de medicina, era vereador em Pindamonhangaba e na semana seguinte disputaria a eleição para prefeito da cidade. Logo pela manhã, recebeu um bilhete de seu pai… Hoje, em sua carteira, ainda carrega o bilhete recebido há 27 anos e se emociona cada vez que o lê”. Este bilhete reproduz literalmente o ponto número 702 do livro Caminho, que aconselha o devoto a “olhar de longe e sem paixão os fatos e as pessoas” para ascender na sociedade.
Um livro indispensável
Conhecer os segredos e os adeptos do Opus Dei não é tarefa fácil. Esta seita sempre atuou da forma mais sigilosa possível. Seus integrantes são proibidos terminantemente de dar publicidade a sua adesão; nem os filhos podem contar aos pais que deram o “apito”, termo usado para indicar a admissão na seita. Eles são recrutados em importantes faculdades ou em clubes das elites, como o Centro Cultural Pinheiros, já que o Opus Dei só se interessa por aqueles que tenham condições de ascender social e politicamente. A Obra de Deus também mantém instituições de fachada, como o Colégio Catamarã, internamente batizado de “cata-moleques”, e a Editora Quadrante. Atualmente, ela possui 1.700 seguidores no Brasil e 80 mil no mundo.
Aos poucos, entretanto, seus segredos vão sendo desvendados com a edição de vários livros e alguns sites na internet. Uma obra indispensável para conhecer esta seita é “Opus Dei: os bastidores”, escrita por três ex-numerários, Jean Lauand, Marcio da Silva e Dario Fortes. O livro é horripilante, revelando todo o obscurantismo e reacionarismo desta organização. Os autores, católicos praticantes que denunciam a seita como um cancro na Igreja Católica, descrevem as práticas de auto-flagelação – cilício, chicote e macacão antimasturbação –; listam os livros que são censurados, os filmes proibidos, a televisão que é chaveada; e denunciam o uso corriqueiro de remédios antipsicóticos para entorpecer os “atormentados”.
Eles também confirmam que a seita tem um projeto bem definido de ascensão na sociedade. “É decisivo para o Opus Dei que os seus membros ou colaboradores exerçam poder”. No sétimo capítulo, intitulado “dominação e manipulação”, os ex-numerários se referem explicitamente a Geraldo Alckmin. Lembram que o ex-governador “foi convidado para dar a palestra de abertura do VII Máster em Jornalismo para Editores (tema: “As relações entre governo e mídia”, no dia 17 de março de 2003, no Centro de Extensão Universitária, entidade presidida pelo doutor Ives Gandra da Silva Martins (membro supernumerário do Opus Dei) e dirigida pelo professor Carlos Alberto Di Franco (membro numerário responsável pelas relações da Obra com a mídia), durante o qual o governador elogiou a iniciativa”.
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Alckmin e o fanatismo do Opus Dei
O candidato Geraldo Alckmin realmente parece um “picolé de chuchu”, segundo a famosa ironia de José Simão. Mas de inocente ele não tem nada. Ele conhece bem a história nefasta do Opus Dei e os seus métodos autoritários, tecnocráticos e “discretos” de agir batem com esta doutrina. Numerário ele não é, já que não reside nos casarões da Obra de Deus, não fez voto de castidade e, tudo indica, não usa duas vezes ao dia o cilício nas cochas (cinturão com pontas de metal) e nem a “disciplina”, outro utensílio de autoflagelação utilizado para chicotear as costas. Mas Alckmin se encaixa perfeitamente no figurino do supernumerário, o seguidor da seita com “disfarce civil” e a missão divina de conquistar poder político para o Opus Dei.
A origem fundamentalista
O Opus Dei (do latim, Obra de Deus) foi fundado em outubro de 1928, na Espanha, pelo padre Josemaría Escrivá. O jovem sacerdote de 26 anos diz ter recebido a “iluminação divina” durante a sua clausura num mosteiro de Madri. Preocupado com o avanço das esquerdas no país, este excêntrico religioso, visto pelos amigos de batina como um “fanático e doente mental”, decidiu montar uma organização ultrassecreta para interferir nos rumos da Espanha. Segundo as suas palavras, ela seria “uma injeção intravenosa na corrente sanguínea da sociedade”, infiltrando-se em todos os poros de poder. Deveria reunir bispos e padres, mas, principalmente, membros laicos, que não usassem hábitos monásticos ou qualquer tipo de identificação.
Reconhecida oficialmente pelo Vaticano em 1947, esta seita logo se tornou um contraponto ao avanço das ideias progressistas na Igreja. Em 1962, o papa João 23 convocou o Concílio Vaticano II, que marca uma viragem na postura da Igreja, aproximando-a dos anseios populares. No seu fanatismo, Escrivá não acatou a mudança. Criticou o fim da missa rezada em latim, com os padres de costas para os fiéis, e a abolição do Index Librorum Prohibitorum, dogma obscurantista do século 16 que listava livros “perigosos” e proibia sua leitura pelos fiéis. “Este concílio, minhas filhas, é o concílio do diabo”, garantiu Escrivá para alguns seguidores, segundo relato do jornalista Emílio Corbiere no livro “Opus Dei: El totalitarismo católico”.
O poder no Vaticano
Josemaría Escrivá faleceu em 1975. Mas o Opus Dei se manteve e adquiriu maior projeção com a guinada direitista do Vaticano a partir da nomeação do papa polonês João Paulo II. Para o teólogo espanhol Juan Acosta, “a relação entre Karol Wojtyla e o Opus Dei atingiu o seu êxito nos anos 80-90, com a irresistível acessão da Obra à cúpula do Vaticano, a partir de onde interveio ativamente no processo de reestruturação da Igreja Católica sob o protagonismo do papa e a orientação do cardeal alemão Ratzinger”. Em 1982, a seita foi declarada “prelazia pessoal” – a única existente até hoje –, o que no Direito Canônico significa que ela só presta contas ao papa, que só obedece ao prelado (cargo vitalício hoje ocupado por dom Javier Echevarría) e que seus adeptos não se submetem aos bispos e dioceses, gozando de total autonomia.
O ápice do Opus Dei ocorreu em outubro de 2002, quando o seu fundador foi canonizado pelo papa numa cerimônia que reuniu 350 mil simpatizantes na Praça São Pedro, no Vaticano. A meteórica canonização de Josemaría Escrivá, que durou apenas dez anos, quando geralmente este processo demora décadas e até séculos, gerou fortes críticas de diferentes setores católicos. Muitos advertiram que o Opus Dei estava se tornando uma “igreja dentro da Igreja”. Lembraram um alerta do líder jesuíta Vladimir Ledochowshy que, num memorando ao papa, denunciou a seita pelo “desejo secreto de dominar o mundo”. Apesar da reação, o papa João Paulo II e seu principal teólogo, Joseph Ratzinger, ex-chefe da repressora Congregação para Doutrina da Fé e atual papa Beto 16, não vacilaram em dar maiores poderes ao Opus Dei.
Vários estudos garantem que esta relação privilegiada decorreu de razões políticas e econômicas. No livro “O mundo secreto do Opus Dei”, o jornalista canadense Robert Hutchinson afirma que esta organização acumula uma fortuna de 400 bilhões de dólares e que financiou o sindicato Solidariedade, na Polônia, que teve papel central na débâcle do bloco soviético nos anos 90. O complô explicaria a sólida amizade com o papa, que era polonês e um visceral anticomunista. Já Henrique Magalhães, numa excelente pesquisa na revista A Nova Democracia, confirma o anticomunismo de Wojtyla e relata que “fontes da Igreja Católica atribuem o poder da Obra a quitação da dívida do Banco Ambrosiano, fraudulentamente falido em 1982”.
O vínculo com os fascistas
Além do rigoroso fundamentalismo religioso, o Opus Dei sempre se alinhou aos setores mais direitistas e fascistas. Durante a Guerra Civil Espanhola, deflagrada em 1936, Escrivá deu ostensivo apoio ao general golpista Francisco Franco contra o governo republicano legitimamente eleito. Temendo represálias, ele se asilou na embaixada de Honduras, depois se internou num manicômio, “fingindo-se de louco”, antes de fugir para a França. Só retornou à Espanha após a vitória dos golpistas. Desde então, firmou sólidos laços com o ditador sanguinário Francisco Franco. “O Opus Dei praticamente se fundiu ao Estado espanhol, ao qual forneceu inúmeros ministros e dirigentes de órgãos governamentais”, afirma Henrique Magalhães.
Há também fortes indícios de que Josemaría Escrivá nutria simpatias por Adolf Hitler e pelo nazismo. De forma simulada, advogava as ideias racistas e defendia a violência. Na máxima 367 do livro Caminho, ele afirma que seus fiéis “são belos e inteligentes” e devem olhar aos demais como “inferiores e animais”. Na máxima 643, ensina que a meta “é ocupar cargos e ser um movimento de domínio mundial”. Na máxima 311, ele escancara: “A guerra tem uma finalidade sobrenatural… Mas temos, ao final, de amá-la, como o religioso deve amar suas disciplinas”. Em 1992, um ex-membro do Opus Dei revelou o que este havia lhe dito: “Hitler foi maltratado pela opinião pública. Jamais teria matado 6 milhões de judeus. No máximo, foram 4 milhões”. Outra numerária, Diane DiNicola, garantiu: “Escrivá, com toda certeza, era fascista”.
Escrivá até tentou negar estas relações. Mas, no seu processo de ascensão no Vaticano, ele contou com a ajuda de notórios nazistas. Como descreve a jornalista Maria Amaral, num artigo à revista Caros Amigos, “ao se mudar para Roma, ele estimulou ainda mais as acusações de ser simpático aos regimes autoritários, já que as suas primeiras vitórias no sentido de estabelecer o Opus Dei com estrutura eclesiástica capaz de abrigar leigos e ordenar sacerdotes se deram durante o pontificado do papa Pio XII, por meio do cardeal Eugenio Pacelli, responsável por controverso acordo da Igreja com Hitler”. Um outro texto, assinado por um grupo de católicas peruanas, garante que a seita “recrutou adeptos para a organização fascista ‘Jovem Europa’, dirigida por militantes nazistas e com vínculos com o fascismo italiano e espanhol”.
Pouco antes de morrer, Josemaría Escrivá realizou uma “peregrinação” pela América Latina. Ele sempre considerou o continente fundamental para sua seita e para os negócios espanhóis. Na região, o Opus Dei apoiou abertamente várias ditaduras. No Chile, participou do regime terrorista de Augusto Pinochet. O principal ideólogo do ditador, Jaime Guzmá, era membro ativo da seita, assim como centenas de quadros civis e militares. Na Argentina, numerários foram nomeados ministros da ditadura. No Peru, a seita deu sustentação ao corrupto e autoritário Alberto Fujimori. No México, ajudou a eleger como presidente seu antigo aliado, Miguel de La Madri, que extinguiu a secular separação entre o Estado e a Igreja Católica.
Infiltração na mídia
Para semear as suas ideias religiosas e políticas de forma camuflada, Escrivá logo percebeu a importância estratégica dos meios de comunicação. Ele mesmo gostava de dizer que “temos de embrulhar o mundo em papel-jornal”. Para isso, contou com a ajuda da ditadura franquista para a construção da Universidade de Navarra, que possuí um orçamento anual de 240 milhões de euros. Jornalistas do mundo inteiro são formados nos cursos de pós-graduação desta instituição. O Opus Dei exerce hoje forte influência sobre a mídia. Um relatório confidencial entregue ao Vaticano em 1979 pelo sucessor de Escrivá revelou que a influência da seita se estendia por “479 universidades e escolas secundárias, 604 revistas ou jornais, 52 estações de rádio ou televisões, 38 agências de publicidade e 12 produtores e distribuidoras de filmes”.
Na América Latina, a seita controla o jornal El Observador (Uruguai) e tem peso nos jornais El Mercúrio (Chile), La Nación (Argentina) e O Estado de S.Paulo. Segundo várias denúncias, ela dirige a Sociedade Interamericana de Imprensa, braço da direita na mídia hemisférica. No Brasil, a Universidade de Navarra é comandada por Carlos Alberto di Franco, numerário e articulista do Estadão, responsável pela lavagem cerebral semanal de Geraldo Alckmin nas famosas “palestras do Morumbi”. Segundo a revista Época, seu “programa de capacitação de editores já formou mais de 200 cargos de chefia dos principais jornais do país”. O mesmo artigo confirma que “o jornalista Carlos Alberto Di Franco circula com desenvoltura nas esferas de poder, especialmente na imprensa e no círculo íntimo do governador Geraldo Alckmin”.
O veterano jornalista Alberto Dines, do Observatório da Imprensa, há muito denuncia a sinistra relação do Opus Dei com a mídia nacional. Num artigo intitulado “Estranha conversão da Folha”, critica seu “visível crescimento na imprensa brasileira. A Folha de S.Paulo parecia resistir à dominação, mas capitulou”. No mesmo artigo, garante que a seita “já tomou conta da Associação Nacional de Jornais (ANJ)”, que reúne os principais monopólios da mídia do país. Para ele, a seita não visa a “salvação das almas desgarradas. É um projeto de poder, de dominação dos meios de comunicação. E um projeto desta natureza não é nem poderia ser democrático. A conversão da Folha é uma opção estratégica, política e ideológica”.
A “santa máfia”
Durante seus longos anos de atuação nos bastidores do poder, o Opus Dei constituiu uma enorme fortuna, usada para bancar seus projetos reacionários – inclusive seus planos eleitorais. Os recursos foram obtidos com a ajuda de ditadores e o uso de máquinas públicas. “O Opus Dei se infiltrou e parasitou no aparato burocrático do Estado espanhol, ocupando postos-chaves. Constituiu um império econômico graças aos favores nas largas décadas da ditadura franquista, onde vários gabinetes ministeriáveis foram ocupados integralmente por seus membros, que ditaram leis para favorecer os interesses da seita e se envolveram em vários casos de corrupção, malversação e práticas imorais”, acusa um documento de católico do Peru.
A seita também acumulou riquezas através da doação obrigatória de heranças dos numerários e do dizimo dos supernumerários e simpatizantes infiltrados em governos e corporações empresariais. Com a ofensiva neoliberal dos anos 90, a privatização das estatais virou outra fonte de receitas. Poderosas multinacionais espanholas beneficiadas por este processo, como os bancos Santander e Bilbao Biscaia, a Telefônica e empresa de petróleo Repsol, tem no seu corpo gerencial adeptos do Opus.
Para católicos mais críticos, que rotulam a seita de “santa máfia”, esta fortuna também deriva de negócios ilícitos. Conforme denuncia Henrique Magalhães, “além da dimensão religiosa e política, o Opus Dei tem uma terceira face: da sociedade secreta de cunho mafioso. Em seus estatutos secretos, redigidos em 1950 e expostos em 1986, a Obra determina que ‘os membros numerários e supernumerários saibam que devem observar sempre um prudente silêncio sobre os nomes dos outros associados e que não deverão revelar nunca a ninguém que eles próprios pertencem ao Opus Dei’. Inimiga jurada da Maçonaria, ela copia sua estrutura fechada, o que frequentemente serve para encobrir atos criminosos”.
O jornalista Emílio Corbiere cita os casos de fraude e remessa ilegal de divisas das empresas espanholas Matesa e Rumasa, em 1969, que financiaram a Universidade de Navarra. Há também a suspeita do uso de bancos espanhóis na lavagem de dinheiro do narcotráfico e da máfia russa. O Opus Dei esteve envolvido na falência fraudulenta do banco Comercial (pertencente ao jornal El Observador) e do Crédito Provincial (Argentina). Neste país, os responsáveis pela privatização da petrolífera YPF e das Aerolineas Argentinas, compradas por grupos espanhóis, foram denunciados por escândalos de corrupção, mas foram absolvidos pela Suprema Corte, dirigida por Antonio Boggiano, outro membro da Opus Dei. No ano retrasado, outro numerário do Opus Dei, o banqueiro Gianmario Roveraro, esteve envolvido na quebra da Parlamat.
“A Internacional Conservadora”
O escritor estadunidense Dan Brown, autor do best seller “O Código da Vinci”, não vacila em acusar esta seita de ser um partido de fanáticos religiosos com ramificações pelo mundo. O Opus Dei teria cerca de 80 milhões de fiéis, muitos deles em cargos-chaves em governos, na mídia e em multinacionais. Henrique Magalhães garante que a “Obra é vanguarda das tendências mais conservadoras da Igreja Católica”. Num livro feito sob encomenda pelo Opus Dei, o vaticanista John Allen confessa este poderio. Ele admite que a seita possui um patrimônio de US$ 2,8 bilhões – incluindo uma luxuosa sede de US$ 60 milhões em Manhattan – e que esta fortuna serve para manter as suas instituições de fachada, como a Heights School, em Washington, onde estudam os filhos dos congressistas do Partido Republicano de George W.Bush.
Numa reportagem que tenta limpar a barra do Opus Dei, a própria revista Superinteressante, da suspeita Editora Abril, reconhece o enorme influência política desta seita. E conclui: “No Brasil, um dos políticos mais ligados à Obra é o candidato a presidente Geraldo Alckmin, que em seus tempos de governador de São Paulo costumava assistir a palestras sobre doutrina cristã ministradas por numerários e a se confessar com um padre do Opus Dei. Alckmin, porém, nega fazer parte da ordem”. Como se observa, o candidato segue à risca um dos principais ensinamentos do fascista Josemaría Escrivá: “Acostuma-se a dizer não”.
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Alckmin e a conspiração do Opus Dei
O presidenciável Geraldo Alckmin se encaixa perfeitamente nos planos políticos e eleitorais do Opus Dei na América Latina. Desde a sua chegada ao continente, nos anos 50, esta seita planeja ardilosamente a sua ascensão ao poder. O projeto só ganhou ímpeto com a onda de golpes militares na região a partir dos anos 60. Seguidores do Opus Dei presidiram ou assessoraram vários ditadores. Nos anos 90, com a avalanche neoliberal no continente, os tecnocratas fiéis a esta seita voltaram a gozar de prestígio. Agora, o Opus Dei torce e trabalha na “surdina” pela eleição de Geraldo Alckmin no segundo turno da sucessão presidencial.
A “catequese” na América Latina
Nos anos 50, a seita aliciou seus primeiros fiéis entre as velhas oligarquias que procuravam se diferenciar dos povos indígenas e pregavam o fundamentalismo religioso. Mas o Opus Dei só adquire pujança com a onda de golpes a partir dos anos 60. Até então, a sua ação ainda era dispersa. Segundo excelente artigo de Marina Amaral na revista Caros Amigos, “em 1970, Josemaría Escrivá viajou para o México dando início às ‘viagens de catequese’ pelas Américas que duraram até às vésperas de sua morte em Roma, em 1975”.
Em 1974, o fundador do Opus Dei visitou a América do Sul, então dominada por ditaduras militares. “O clero progressista tentava utilizar o peso da Igreja para denunciar torturas e assassinatos e para lutar pelo restabelecimento da democracia. Em suas palestras, ele respondeu certa vez a um militar que perguntara como seguir o caminho da ‘santificação espiritual’ do Opus Dei: ‘Os militares já têm metade do caminho espiritual feito’”, revela Marina Amaral. Neste período sombrio, a seita apoiou os golpes e participou de vários governos ditatoriais, segundo Emílio Corbiere, autor do livro “Opus Dei: El totalitarismo católico”.
No Chile, a seita fascista foi para o ditador Augusto Pinochet o que fora para o franquismo na Espanha. O principal ideólogo deste regime sanguinário, Jaime Guzmá, era um membro ativo desta seita, assim como centenas de quadros civis e militares. Ela também apoiou os golpes militares e participou ativamente dos regimes autoritários na Argentina, Paraguai e Uruguai. Ainda segundo Corbiere, o Opus Dei financiou o regime do ditador nicaragüense Anastácio Somoza até sua derrota para os sandinistas. Na década de 90, ela ainda deu “ativa assistência” à ditadura terrorista e corrupta de Alberto Fujimori, no Peru.
O fundamentalismo neoliberal
Outra fase “próspera” do Opus Dei se dá com a ofensiva neoliberal na década de 90. Gozando da simpatia do papa e da total autonomia frente às igrejas locais, esta seita se beneficia da invasão das multinacionais espanholas, decorrente da privatização de estatais. Muitas delas são influenciadas por numerários do Opus Dei. Conforme relembra Henrique Magalhães, em artigo para a revista A Nova Democracia, “a Argentina entregou as suas estatais de telefonia, petróleo, aviação e energia à Telefônica, Repsol, Ibéria e Endesa, respectivamente. A Ibéria já havia engolido a LAN [aviação], do Chile, onde a geração de energia já era controlada pela Endesa. Os bancos espanhóis também chegaram ao continente neste processo”.
“O Opus Dei é para o modelo neoliberal o que foram os dominicanos e os franciscanos para as cruzadas e os jesuítas para a Reforma de Lutero”, compara José Steinsleger, colunista do mexicano La Jornada. Nos anos 90, a seita também emplacou vários bispos e cardeais na região. O mais famoso é Juan Cipriani, do Peru, amigo intimo do ditador Alberto Fujimori. Em 1997, quando da invasão da embaixada do Japão por militantes do Movimento Revolucionário Tupac Amaru, o bispo se valeu da condição de mediador e usou um aparelho de escuta no crucifixo, o que permitiu à polícia invadir a casa e matar todos seus ocupantes.
Os tentáculos no Brasil
No Brasil, o Opus Dei fincou a sua primeira raiz em 1957, na cidade de Marília, no interior paulista, com a fundação de dois centros. Em 1961, dada à importância da filial, a seita deslocou o numerário espanhol Xavier Ayala, segundo na hierarquia. “Doutor Xavier, como gostava de ser chamado, embora fosse padre, pisou em solo brasileiro com a missão de fortalecer a ala conservadora da Igreja. Às vésperas do Concílio Vaticano II, o clero progressista da América Latina clamava pelo retorno às origens revolucionárias do cristianismo e à ‘opção pelos pobres’, fundamentos da Teologia da Libertação”, explica Marina Amaral.
Ainda segundo seu relato, “aos poucos, o Opus Dei foi encontrando seus aliados na direita universitária… Entre os primeiros estavam dois jovens promissores: Ives Gandra Martins e Carlos Alberto Di Franco, o primeiro simpático ao monarquismo e candidato derrotado a deputado; o segundo, um secundarista do Colégio Rio Branco, dos rotarianos do Brasil. Ives começou a freqüentar as reuniões do Opus Dei em 1963; Di Franco ‘apitou’ (pediu para entrar) em 1965. Hoje, a organização diz ter no país pouco mais de três mil membros e cerca de quarenta centros, onde moram aproximadamente seiscentos numerários”.
Crescimento na ditadura
Durante a ditadura, a seita também concentrou sua atuação no meio jurídico, o que rende frutos até hoje. O promotor aposentado e ex-deputado Hélio Bicudo revela ter sido assediado duas vezes por juízes fiéis à organização. O expoente nesta fase foi José Geraldo Rodrigues Alckmin, nomeado ministro do STF pelo ditador Garrastazu Médici em 1972, e tio do atual presidenciável. Até os anos 70, porém, o poder do Opus Dei era embrionário. Tinha quadros em posições importantes, mas sem atuação coordenada. Além disso, dividia com a Tradição, Família e Propriedade (TFP) as simpatias dos católicos de extrema direita.
Seu crescimento dependeu da benção dos generais golpistas e dos vínculos com poderosas empresas. Ives Gandra e Di Franco viraram os seus “embaixadores”, relacionando-se com donos da mídia, políticos de direita, bispos e empresários. É desta fase a construção da sua estrutura de fachada – Colégio Catamarã (SP), Casa do Moinho (Cotia) e Editora Quadrante. Ela também criou uma ONG para arrecadar fundos: OSUC (Obras Sociais, Universitárias e Culturais). Esta recebe até hoje doações do Itaú, Bradesco, GM e Citigroup. Confrontado com esta denúncia, Lizandro Carmona, da OSUC, implorou à jornalista Marina Amaral: “Pelo amor de Deus, não vá escrever que empresas como o Itaú doam dinheiro ao Opus Dei”.
Ofensiva recente na região
Na fase recente, o Opus Dei está excitado, com planos ousados para conquistar maior poder político na América Latina. Em abril de 2002, a seita participou ativamente do frustrado golpe contra o presidente Hugo Chávez, na Venezuela. Um dos seus seguidores, José Rodrigues Iturbe, foi nomeado ministro das Relações Exteriores do fugaz governo golpista. A embaixada da Espanha, governada na época pelo neo-franquista Partido Popular (PP), de José Maria Aznar – cuja esposa é do Opus Dei –, deu guarita aos seus fiéis. Outro golpista ligado à seita, Gustavo Cisneiros, é megaempresário das telecomunicações no país.
Em dezembro do ano passado, o Opus Dei assistiu a derrota do seu candidato, Joaquim Laví, ex-assessor do ditador Augusto Pinochet, à presidência do Chile. Já em maio deste ano, colheu uma nova derrota com a candidatura de Lourdes Flores, declarada numerária do partido Unidade Nacional. Em compensação, a seita comemorou a vitória do narco-terrorista Álvaro Uribe na Colômbia, que também dispôs de milhões de dólares do governo George Bush. Já no México, outro conhecido simpatizante do Opus Dei, Felipe Calderon, ex-executivo da Coca-Cola, venceu uma das eleições mais fraudulentas da história deste país.
Um perigo sorrateiro
Agora, como afirma o estudioso Henrique Magalhães, “as esperança do Opus Dei se voltam para Geraldo Alckmin, que hoje é um dos seus quadros políticos de maior destaque. A Obra tenta fazer dele presidente e formar um eixo geopolítico com os governantes da Colômbia e do México, aos quais está intimamente associada”. De maneira ardilosa, a seita usará todos os “recursos”. Prova do seu método pode ser visto na recente eleição do Senado no Rio de Janeiro, onde foi desencadeada brutal campanha contra a candidatura da comunista Jandira Feghali. Não por acaso, dois dos principais numerários do país atuam neste estado: o bispo de Nova Friburgo, Rafael Cifuentes, e o bispo-auxiliar dom Antônio Augusto Dias Duarte.
Apesar de ter mentido numa recente sabatina ao jornal Folha de S.Paulo, quando afirmou que “não sou da Opus Dei; respeito quem é, mas não conheço”, hoje são notórias as estreitas relações de Geraldo Alckmin com esta seita fascista – desde os tempos de infância, no convívio com seu pai e o tio-ministro do STF da ditadura, até as irregulares “palestras do Morumbi”. Na excelente reportagem da revista Caros Amigos, a jornalista Marina Amaral lembra o constrangimento do padre Vicente Ancona, numerário do Opus Dei que lhe atendeu: “Quando perguntei ao padre Vicente Ancona se Alckmin estava recebendo orientação espiritual e desistiu por causa da repercussão, a resposta foi curta e grossa; ‘Exato’”.