Por Rafael Duarte, no site Saiba Mais:
A vitória de Fátima quebra uma sequência de governos dirigidos por famílias tradicionais ou de políticos ligados às oligarquias locais. Carlos Eduardo Alves, adversário da candidata do PT no 2º turno, é sobrinho do ex-governador Aluízio Alves e filho do ex-prefeito de Natal e de Parnamirim Agnelo Alves, os dois principais nomes da oligarquia Alves, no poder há mais de 60 anos no Estado.
A petista é a primeira governadora de origem popular da história do Estado. Um fato que chamava a atenção desde o 1º turno, quando os dois principais adversários reuniram em suas chapas todos os ex-governadores vivos do Rio Grande do Norte, responsáveis pela situação de caos administrativo e financeiro do Estado.
Outro dado que merece destaque na vitória de Fátima é a desigualdade de gênero nos governos estaduais. A petista será a única mulher a governar um Estado no país, entre os 26 estados, além do Distrito Federal. Ao todo, 30 mulheres se candidataram aos governos estaduais.
A campanha de Fátima Bezerra começou a ser desenhada há dois anos, quando o nome da senadora começou a aparecer já na liderança das pesquisas de intenção de voto para o Governo do Estado. De lá para cá, a candidata do PT se manteve em 1º lugar e pouco foi ameaçada pelos adversários, que buscavam explorar o sentimento de antipetismo aflorado na polarizada campanha nacional para a presidência da República.
Os sinais mais fortes de que Fátima venceria a disputa foram sentidos após o resultado das urnas do 1º turno, quando os eleitores deixaram sem mandato políticos tradicionais que há anos se revezavam em cargos do Executivo e legislativa do Rio Grande do Norte. Os principais derrotados apoiaram Carlos Eduardo Alves no 2º turno.
Os senadores Garibaldi Alves (MDB) e José Agripino Maia (DEM) foram casos exemplares dessa rejeição. Alves concorria à reeleição e ficou em 4º lugar, atrás do ex-governador Geraldo Melo (PSDB). A derrota de José Agripino também foi sintomática, já que ele dava como certa a eleição para deputado federal.
Outra rejeição eleitoral simbólica foi o fracasso da candidatura à reeleição do deputado federal Rogério Marinho (PSDB), relator da reforma trabalhista e símbolo do “antipetismo” no Rio Grande do Norte. Ele terminou o pleito em 12º lugar, na segunda suplência da coligação.
O declínio das oligarquias no Estado foi inversamente proporcional ao fortalecimento do próprio PT já no 1º turno, que conseguiu eleger, pela primeira vez na história, dois deputados estaduais, com Isolda Dantas e Francisco do PT (a coligação fez três) e dois deputados federais, com as eleições de Natália Bonavides e Fernando Mineiro.
As emoções do 2º turno ficaram reservadas a partir da entrada indireta do candidato de extrema-direita Jair Bolsonaro na campanha de Carlos Eduardo Alves.
Mesmo o PDT declarando “voto útil” em Fernando Haddad, candidato do PT, três candidatos a governos estaduais que disputaram o 2º turno pela legenda de Leonel Brizola e Darcy Ribeiro decidiram por conta própria surfar na onda Bolsonaro, entre eles Carlos Eduardo Alves.
Líderes do partido chegaram a pedir a expulsão dos candidatos que traíram o PDT. O ex-prefeito de Natal se defendeu dizendo que conseguiu a liberação junto ao próprio presidente nacional da sigla, Carlos Lupi.
Ainda que Bolsonaro tenha se recusado a gravar vídeos para candidatos de outros partidos que não fossem do PSL, Carlos Eduardo colou no candidato da extrema-direita, surpreendendo a ala progressista que costuma votar nele.
A estratégia conseguiu atrair eleitores de Bolsonaro num primeiro momento, mas o crescimento de Fernando Haddad na reta final da campanha arrefeceu a possível arrancada da campanha de Alves.
A tarefa da governadora eleita Fátima Bezerra será complicada. No entanto, como a própria campanha petista reforçou no 2º turno, estados governados pelo PT, como a Bahia, ou por partidos aliados, como o PCdoB, no Maranhão, também herdaram gestões de oligarquias enraizadas no poder e conseguiram realizar grandes trabalhos do ponto de vista administrativo, a ponto de serem reeleitos no 1º turno.
Para que isso aconteça, no entanto, a governadora eleita terá que evitar atravessadores desde agora e formar uma equipe técnica competente e que conheça os meandros da política, já que para o governo Fátima dar certo os auxiliares da petista deverão estar cientes de que será preciso muito diálogo, sem subserviência, com a Assembleia Legislativa, Tribunal de Justiça e Tribunal de Contas do Estado.
Dados da pesquisa Certus/FIERN divulgadas ainda antes da campanha começar apontaram a Segurança Pública como o tema prioritário para os potiguares. Essa tem que ser a prioridade zero de Fátima. Outra questão a ser solucionada em curto prazo é o pagamento em dia dos servidores públicos estaduais, o que não acontece desde 2016.
Como professora formada em Pedagogia e discípula de Paulo Freire, Fátima Bezerra também será cobrada para tirar dos últimos lugares a educação do Estado. Pode sair dessa área a grande marca da gestão Fátima.