Grande número de idosos, desrespeito à quarentena e poucos testes realizados foram alguns dos fatores responsáveis pela emergência no país
Uma das razões para a alta mortalidade no país é o grande número de idosos, proporcionalmente maior que na China — a idade média do italiano é de 44 anos, contra 37 dos chineses. Segundo o Instituto Superior de Saúde, ligado ao Ministério da Saúde, a idade média do italiano que se infecta pelo novo vírus é de 63 anos.
Em quarentena há trezes dias, o país foi o primeiro a impor um confinamento geral à população para tentar frear a pandemia, que se tornou a sua mais grave crise desde a Segunda Guerra Mundial. Tomada para preservar o seu sistema de saúde, a medida extrema, após resistência inicial dos pares europeus, acabou sendo adotada por países como Espanha e França.
Mas o momento em que ele se alastrou no país europeu, pelo menos desde janeiro, também contribuiu para o panorama: trata-se de um período frio, em que tradicionalmente há mais casos de gripe, confundida inicialmente com a Covid-19.
— A principal razão é o tamanho da nossa população de idosos — afirma o médico Antonio Montegrandi, especializado em doenças infectivas. — Até agora, as vítimas relacionadas à Covid-19 com menos de 50 anos são raras, e todas conviviam com alguma doença séria.
Médico em Roma, ele teve dois pacientes que morreram por complicações relacionadas ao coronavírus: um de 84 anos e outro de 92.
A situação é mais crítica na Lombardia, região do Norte, uma das mais ricas do país, onde o número de mortos já superou dois mil. Responsável por um quarto do PIB nacional e com um sistema de saúde considerado um dos melhores da Europa, a região está próxima do colapso, com escassez de médicos e falta de leitos em UTIs.
Outro aspecto que explica a rápida difusão, e que inevitavelmente contribui com o índice de mortes, é a dificuldade dos italianos em respeitar a quarentena, o que foi muito discutido no país nos últimos dias. Montegrandi diz que o modo de vida “irresponsável” de seus conterrâneos contribui, um povo que, segundo ele, “não tem um senso cívico” e é “um pouco rebelde” com as regras.
O contraste da anarquia italiana, conta ele, fica evidente quando comparado ao esforço feito em lugares como China e Coreia do Sul, nações mais disciplinadas que a italiana:
— Como se trata de um vírus muito contagioso, esse modo de vida se transforma num problema. Muitos jovens estão infectados, não apresentam sintoma, pensam que estão bem e continuam a infectar outras pessoas, tornando-se um perigo para a faixa de risco. Por isso é importante respeitar a quarentena.
Montegrandi defende que a Itália deveria realizar exames em massa na população para conseguir isolar os eventuais infectados assintomáticos, medida que não está sendo adotada. Especialistas e o próprio governo reconhecem que há uma subnotificação dos casos na contagem nacional — são mais de 41 mil positivos ao teste, entre pessoas ainda em tratamento e que já se curaram, mas o número real de contaminados pode ser três vezes maior.
Antes de o governo decretar o confinamento nacional, as primeiras medidas de restrição se concentravam nas cidades do Norte, epicentro da difusão na Itália. Quando a recomendação era de permanecer em casa, muitos foram passear em praias e estações de esqui, que ficaram cheias.
Fotos de aglomerações nesses lugares ganharam as redes e foram citadas pelos ministros do governo e pelo governador da Lombardia para justificar as medidas extremas. Entre as pessoas que foram esquiar estava um senhor infectado pelo Covid-19, que deveria obrigatoriamente estar em isolamento.
Outro problema para conter o vírus surgiu quando soube-se que o governo iria decretar uma quarentena em todo o país: houve um deslocamento em massa do Norte — em trens, ônibus e aviões — para as cidades do Centro e do Sul da Itália, regiões onde a epidemia está mais controlada. Infectologistas do Instituto Superior de Saúde, que monitoram a emergência, consideraram a atitude irresponsável.