A maioria das pessoas faz compras no comércio informal – ou clandestino, dependendo do ponto de vista de cada um – ou adquire produto falsificados com alguma frequência. Trata-se de fato estatístico, mas é fácil chegar a essa conclusão sem maiores estudos: basta observar a presença de vendedores ambulantes, em graus variados de sofisticação, nas esquinas da cidade, com destaque para Vilas do Atlântico.
Se há oferta desses produtos é porque há demanda. Esse era, inclusive, o argumento habitual da prefeitura de Lauro de Freitas, anos atrás, ao responder, adotando viés político, as acusações de que não havia combate à desordem do comércio informal ou à venda de artigos falsificados. A atual gestão municipal deixou de apontar o dedo aos consumidores para tentar justificar a inação do Poder Público – e passou a fiscalizar os clandestinos. Mas as ações são esparsas e descontinuadas, resultando em coisa alguma.
Qualquer comerciante regularmente instalado, que pagou pelo ponto comercial e todos os meses paga os seus impostos, sabe que sim, a maioria dos consumidores eventualmente compra produtos clandestinos ou falsificados. Uma pesquisa do Ibope encomendada pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) já havia afirmado a mesma coisa no ano passado. A pesquisa entrevistou 15.414 pessoas em 727 municípios brasileiros.
Nada menos que 75% dos participantes admitiram que compravam de ambulantes ou lojas informais. E cerca de 71% informaram que adquiriam produtos piratas ou imitações de marcas famosas, seja sempre, às vezes ou raramente. Os que nunca compraram no comércio informal eram 24% e os que nunca adquiriram falsificações, 28%. Uma minoria, portanto.
Entre os que adquiriam produtos de ambulantes ou estabelecimentos informais, 13% compravam sempre, 37% às vezes e 25% raramente. Já entre os consumidores que compravam produtos piratas ou imitações de marcas famosas, seja no comércio formal ou informal, 13% compravam sempre, 34% às vezes e 24% raramente.
O economista Renato da Fonseca, gerente de Pesquisa e Competitividade da CNI, admitia que o percentual de consumidores que recorre ao mercado informal é elevado. Parte do motivo seriam os preços mais baixos, mas em Vilas do Atlântico isso nem sempre é verdade. A comodidade de comprar no meio da rua, às vezes sem sair do carro, pode contar mais.
Principalmente no caso dos produtos piratas, Fonseca acredita que a maioria dos consumidores não percebe as consequências negativas do ato. O apelo é à consciência cívica coletiva – logo inócuo: ao copiar os produtos originais, o mercado pirata diminui a capacidade de a economia ser criativa, crescer e gerar empregos. Além disso, lembra o economista, o mercado informal não paga impostos, praticando uma concorrência desleal.
São argumentos que poderão significar alguma coisa para os que nunca compraram no comércio informal (24%) ou para os que nunca adquiriram falsificações (28%). Mesmo assim, essa minoria poderá ter outras razões para preferir as marcas originais ou gostar de frequentar lojas com ar condicionado.
“Loja” vende carros. Mais à frente, funcionam uma “lanchonete” e uma “boutique”
A CNI lembrava ainda que o consumidor do mercado informal ou pirata ainda por cima desestimula o trabalho formal, reduzindo também os ganhos dos trabalhadores. Em tempos de desemprego em alta, contudo, o argumento parece insuficiente. Hoje o comércio clandestino também é estimulado pela falta de empregos no comércio regular. Por outro lado, os irregulares sequestram clientela dos formais, fragilizando mais a oferta de empregos. O processo conduz à informalização crescente da economia.
Quem estende o braço na rua para vender uma pizza caseira está em busca de gerar renda para si e para a sua família. Trata-se, também, de um problema social. Já veículos casualmente estacionados na rua atrás do posto de combustível dentro de Vilas do Atlântico, com avisos de “vendese”, oferecendo até brindes para os clientes, não parecem ser caso de subsistência familiar. O problema não é tão simples.
Embora a grande maioria dos consumidores prefira ignorar os fatos, há uma lista deles a aconselhar a compra no comércio regular. Por exemplo: é ilusória a vantagem de pagar menos por um produto porque a compra informal não tem garantias. O consumidor assume todos os riscos, começando pela qualidade. Não há como trocar, não há Código de Defesa do Consumidor a que recorrer.
Um brinquedo, por exemplo, pode soltar tinta, ter peças pequenas que se desprendem facilmente. E uma pizza caseira vendida no meio-fio não passou por controles sanitários oficiais – o que não quer dizer que eles funcionem para a formalidade, mas neste caso ao menos se poderá responsabilizar alguém.
Fonseca lembra também que algumas vezes o consumidor que adquire o produto pirata não tem outra opção. “Ou compra um produto de baixa qualidade ou fica sem”, define. Mais uma vez, a demanda justifica a oferta.
O problema é que nem tudo a economia justifica. Sem algum tipo de ordenamento a desordem transforma-se em norma. Em vez das lojas e restaurantes do comércio formal, em pouco tempo teríamos apenas bancas de ambulantes e foodtrucks estacionados nos meios-fios. Como ninguém pagaria impostos, não haveria nem fiscalização da qualidade, nem serviços públicos.
Fonte: Vilas Magazine
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