Painel da Safernet e do Governo do Reino Unido no FIB14, em Curitiba, discutiu possibilidades e desafios na formação de docentes
Professores do ensino básico têm se deparado com muitos desafios para incluir as tecnologias na educação e, principalmente, para educar sobre o uso delas com consciência e segurança. Estes foram alguns dos pontos ressaltados pelos debatedores do painel promovido pela Safernet e o Governo do Reino Unido no 14º Fórum da Internet no Brasil (FIB14), em Curitiba, em maio passado.
Segundo a pesquisa TIC Educação 2022, divulgada no ano passado, 44% dos professores da educação básica no Brasil não tiveram acesso a qualquer tipo de formação continuada sobre uso de TICs na educação em 2022.
Confira a pesquisa completa aqui.
Assista ao o painel da Safernet e do Governo do Reino Unido no FIB14
Professoras e professores se deparam com a ausência de infraestrutura nas suas escolas e também com uma concepção que ainda é recorrente de que crianças e adolescentes são “nativos digitais”, uma vez que é comum que usem TICs desde a primeira infância. Com isso, muitas vezes podem se sentir inseguros ou não aptos a orientar estudantes sobre como utilizar as tecnologias de uma forma consciente e responsável, tema que deve estar presente no ensino básico, de acordo com a Base Nacional Comum Curricular.
A inclusão digital abrange não apenas o acesso à internet e o uso de dispositivos e aplicações, mas também o desenvolvimento de habilidades e competências para o uso seguro e consciente das tecnologias. Portanto, é fundamental que professores possam estar plenamente capacitados com conhecimento e as ferramentas necessárias para orientar crianças e adolescentes sobre como promover cidadania e se proteger de possíveis riscos na rede.
É o que prevê também o Marco Civil da Internet, que completou 10 anos em 2024, e a recente Política Nacional de Educação Digital.
Entretanto, como os dados da TIC Educação e outras pesquisas importantes apontam, há uma lacuna significativa para que isso se torne realidade, iniciando com a formação docente. A Disciplina de Cidadania Digital, criada pela Safernet e pelo Governo do Reino Unido, se apresenta como uma opção para os professores lidarem com esses desafios e para que estudantes de todo o Brasil tornem-se cidadãos digitais, utilizando as tecnologias de informação com consciência, ética e segurança.
Painelistas
Um ponto importante foi ressaltado pelo professor Douglas Pereira da Costa, do Instituto Federal do Ceará, doutorando em Educação que está pesquisando justamente a formação de professores. Para ele, a formação de profissionais da Educação no campo do uso de tecnologias tem foco muito grande no “instrumental”, ou seja, em como usar as tecnologias.
Segundo ele, uma formação em cidadania digital “exige uma perspectiva crítica, ética, cidadã, responsável e autoral”, ou seja, professores e alunos devem entender que são capazes de criar com as tecnologias. “O professor é uma pessoa impactada pelas tecnologias, como qualquer um, e deve fazer leituras críticas do mundo digital”, afirmou.
A Coordenadora-Geral de Tecnologia e Inovação na Educação Básica do Ministério da Educação (MEC), Ana Úngari Dal Fabbro, que também é mestre em Estudos do Desenvolvimento pela London School of Economics, indicou que o ministério tem atuado em três frentes quando o tema é tecnologias na educação: ensino e aprendizado com uso de tecnologias digitais, cidadania digital, e desenvolvimento profissional.
O eixo de cidadania digital é um dos destaques da nova política de Escolas Conectadas, lançada pelo Governo Federal no final do ano passado. Na formação de professores, a plataforma Avamec foi apresentada como um esforço do MEC, incluindo a recente adição de três novos cursos sobre o tema de cidadania digital.
Ela afirma que o professor que for lidar com cidadania digital precisa “ser um cidadão digital antes de levar essa visão para os seus estudantes. O professor precisa ter clareza do que é uso responsável, seguro e crítico da tecnologia”, até para que o sistema educacional como um todo cumpra a Lei 14533/2023 que prevê a educação digital como componente do currículo dos ensinos fundamental e médio.
Confira o mural colaborativo criado pelos painelistas com referências sobre o tema
Por sua vez, Karina Daidone Pimentel, mestre em comunicação pela FGV-SP, e responsável pelos projetos educacionais da Fundação Telefônica Vivo, instituição que está há 25 anos no Brasil, defendeu que a formação docente precisa ser continuada e dinâmica, compreendendo os diferentes contextos de atuação dos professores e incluindo formações rápidas.
“A tecnologia dentro da escola, na educação, está mais para um estímulo de uso e prática pedagógica e que desenvolva habilidades. Por consequência, este aluno estará apto a ser um cidadão digital”, afirmou.
Bianca Serrão, psicóloga e doutora em Estudos da Criança pela Universidade do Minho, em Portugal, e integrante da equipe do Canal de Ajuda e dos projetos de educação da Safernet Brasil, apresentou a Disciplina de Cidadania Digital da Safernet e o curso Segurança e Cidadania Digital em Sala de Aula, voltado para professores que queiram ministrar a disciplina, como uma opção nesse cenário.
Apesar de o curso de formação ser autoinstrucional, a Safernet dá apoio aos professores durante os estudos e, principalmente, quando eles aplicam os temas em sala de aula. O curso apresenta o caderno de aulas da Disciplina de Cidadania Digital e os temas que poderão ser trabalhados por eles com os alunos.
“Oferecemos acolhimento aos professores, seja apoiando a adaptação de atividades, compartilhando experiências, valorizando suas práticas pedagógicas em sala de aula ao falar sobre cidadania digital com seus estudantes”, afirmou.
O debate foi mediado por Guilherme Alves, gerente de projetos da Safernet, e Letícia Hungria, gerente do Programa de Acesso Digital da Embaixada do Reino Unido.
Disciplina de Cidadania Digital
A Safernet e o Governo do Reino Unido são parceiros desde 2021 na criação e aplicação Disciplina de Cidadania Digital, projeto que integra o DAP (sigla em inglês para Programa de Acesso Digital, que visa ampliar a inclusão digital em vários países).
O DAP, segundo Letícia Hungria, é voltado para três pilares: conectividade, proteção e prosperidade (empreendedorismo). O programa do Governo Britânico alcança, além do Brasil, África do Sul, Indonésia, Quênia e Nigéria.
Desde o início de 2023, quando foi iniciada a fase de aplicação da disciplina, mais de 29000 alunos tiveram contato com o conteúdo, em 259 escolas, de 179 municípios localizados em 16 unidades da federação brasileiras. A disciplina é voltada para estudantes do Ensino Médio e dos dois últimos anos do Ensino Fundamental.
Educadores podem baixar o caderno de aulas diretamente na página da Disciplina de Cidadania Digital e fazer sua inscrição no curso de formação “Segurança e Cidadania Digital em sala de aula” da Safernet.
Espalhados em todos os estados brasileiros e no Distrito Federal, mais de 3000 professores já se matricularam na formação.
Veja aqui o mapa interativo com os resultados completos do projeto até agora. É possível ver os dados por estado e por ano.
Veja recentes reportagens sobre a Disciplina de Cidadania Digital aqui.
Sobre a Safernet
A Safernet existe desde 2005 e tornou-se a ONG brasileira de referência na promoção dos direitos humanos na internet. Com uma abordagem multissetorial, atua no combate a crimes cibernéticos contra os Direitos Humanos, no acolhimento de vítimas de violência online e em programas de educação, prevenção e conscientização. A Safernet mantém a Central Nacional de Denúncias, conveniada ao Ministério Público Federal e o Canal de Ajuda, o Helpline, para vítimas de violência e outros problemas online. A Safernet promove o uso seguro da internet com projetos educacionais como a Disciplina de Cidadania Digital.
Matéria publicada em 4 de junho de 2024.