Luiz Maranhão é o coordenador das Aldeias Infantis de Lauro de Freitas
O ano de 2017 trará novas normas para as instituições que trabalham com o acolhimento de crianças e adolescentes, o que tem gerado apreensão entre os gestores das entidades.
A partir do dia 1º de janeiro, as parcerias celebradas entre prefeituras de todo o território nacional e as organizações da sociedade civil municipais passam a ser regulamentadas pela Lei 13.019/2014, conhecida como marco regulatório das organizações da sociedade civil (OSCs).
Na prática, isso significa que as parcerias firmadas a partir desta data terão que obedecer a um novo regime jurídico, considerando exigências e responsabilidades que envolvem desde a seleção das propostas até a prestação de contas.
A legislação, que já estava em vigor desde 23 de janeiro deste ano para a União, os estados e o Distrito Federal, passará a valer também para os municípios.
A ideia do governo federal e das entidades que ajudaram a elaborar o documento é que, dessa forma, haja maior transparência na aplicação dos recursos públicos, já que o país registra escândalos em diversas áreas com o repasse suspeito de verbas federais a OSCs.
Há, no entanto, quem questione a efetividade dessa lei. “O que eles vão fazer é burocratizar ainda mais um processo que já é complicado para nós, gestores dessas instituições. Por conta da falta de honestidade de algumas entidades, todas pagam”, diz o diretor de uma organização de Salvador, sem querer se identificar.
Entre as mudanças trazidas pelo novo marco regulatório está a substituição do modelo de contratação atualmente feita por convênios – instrumento que regula o repasse de verbas – pelo sistema de edital de chamamento público.
A partir desse chamamento serão avaliadas diferentes propostas para escolher a organização mais adequada à parceria para a realização do trabalho. A nova legislação permite, ainda, a escolha de um grupo de organizações para trabalhar em rede.
Outra alteração é que as novas parcerias serão efetuadas por meio de termo de colaboração (quando é proposto pela administração) ou termo de fomento (quando é proposto pela organização civil) e o acordo de cooperação, este último para parcerias realizadas sem transferência de recursos.
Os convênios passarão a ser utilizados somente para a relação do governo federal com estados e municípios, apenas entre entes públicos, portanto. Já os convênios já firmados permanecem vigentes sob as regras anteriores até a data de renovação das parcerias.
Convênios
No caso de Salvador, o encerramento da vigência do convênio realizado em 2012 entre as instituições de acolhimento e a prefeitura vence amanhã, um dia antes de a lei do marco regulatório entrar em vigor, o que gerou dúvidas quanto ao modo de contratação que seria utilizado.
Além disso, houve uma mudança do valor do recurso público repassado às instituições. Atualmente, a verba por pessoa abrigada é de R$ 518,61, valor partilhado entre a União (R$ 90), o estado (R$ 240,86) e o município (R$ 187,75); e passou para R$ 980, sendo R$ 500 o piso federal; R$ 240 o piso estadual; e R$ 240 o piso municipal.
Para receber o valor atualizado, no entanto, é necessário que a instituição tenha se adequado às novas normas do Plano Municipal de Acolhimento. A rede conveniada é composta por 11 entidades, além de três serviços de execução direta da Fundação Cidade Mãe. Até o momento, apenas a Organização do Auxílio Fraterno (OAF) recebe a nova per capita.
Os gestores das demais entidades alegam estar com dificuldades para fazer as modificações. O Plano Municipal de Acolhimento de Salvador foi produzido em 2015, e, desde então, as entidades tentam fazer as adaptações necessárias.
A elaboração do documento é uma determinação federal e segue orientações do Ministério do Desenvolvimento Social e de Combate à Fome (MDS), a partir da resolução nº 23/2013 do Conselho Nacional de Assistência Social (CNAS). A resolução estabelece uma série de regras e prazos visando à adequação e ao reordenamento da oferta de serviços de alta complexidade para crianças e adolescentes.
O prazo inicial dado às instituições para se adequarem às normas era o dia 31 de dezembro de 2017, mas, de acordo com a titular da Secretaria de Promoção Social e Combate à Pobreza (Semps), Ana Paula Matos, as instituições terão mais um ano para fazer as modificações necessárias.
A secretária garantiu, ainda, que todas as instituições de acolhimento conveniadas à prefeitura de Salvador terão seus contratos renovados por mais um ano e que irá repassar o valor atualizado integralmente.
A decisão foi tomada após reunião realizada no dia 19 de dezembro com gestores das entidades, a Semps, representantes da Ministério Público, da Defensoria Pública, do Tribunal de Justiça, da Procuradoria e da Controladoria do Município.
“Depois que a lei entrar em vigor, só poderão entrar em credenciamento ou efetuar a renovação aquelas que obedecerem às novas normas”, alerta Ana Paula.
Plano
Entre as medidas exigidas aos serviços de acolhimento municipais, conveniados ou não às prefeituras, estão a limitação do número de vagas, que passou a ser de no máximo 20 crianças ou adolescentes, no caso dos abrigos; e de dez por cada casa-lar.
As instituições que contam com um número de abrigados superior ao limite estabelecido estão sendo orientadas a fazer o trabalho de reinserção familiar, quando possível; encaminhá-las para outras entidades ou para adoção.
Esse foi o caso da sede de Lauro de Freitas das Aldeias Infantis SOS Brasil. A entidade internacional que acolhe crianças e adolescentes de 0 a 18 anos contava com 107 crianças que eram distribuídas em 13 casas-lares em um terreno de 30 mil m². Hoje, tem apenas 27 abrigados e apenas três casas em funcionamento. Cada uma dessas casas conta com uma mãe social.
De acordo com o coordenador da instituição, Luiz Mendonça, isso fez com que o número de pessoas que faz doações mensais, chamados de Amigos SOS, se reduzisse drasticamente. Em 2013, a entidade tinha 406 doadores cadastrados de Salvador e 126 de Lauro de Freitas. Hoje, são 269 e 32, respectivamente.
“As pessoas acham que estamos fechando, que não fazemos mais o trabalho ou que, pelo número de crianças, não é mais necessário ajudar e nós precisamos muito desse apoio”, afirma.
Fonte: A Tarde