Editorial da Revista do Brasil:
Pouco depois das eleições de 2 de outubro, circulou a informação de que a Polícia Federal quer parar com as delações na Lava Jato – a pretexto de não contaminar a legalidade da operação. Desde seu início, há mais de dois anos, 66 delatores tiveram punições reduzidas ou transformadas em prisão domiciliar para desfrutar com mais conforto da parte da fortuna que não tiveram de devolver. Apesar de o primeiro deles, o ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa, ter dito que a corrupção de que participava teria sido iniciada nos anos FHC, nenhum tucano foi preso preventivamente. Assim como nenhum integrante do PMDB de Eduardo Cunha e Michel Temer. Agora que delatores mais graúdos da Odebrecht e Andrade Gutierrez podem manchar nomes que não convém, melhor parar. E depois das eleições.
A Lava Jato deu sequência a um processo de satanização da política acentuado a partir de 2013. Iniciada no ano seguinte, baseou-se em alicerces que jamais seriam tolerados pela Justiça… dos Estados Unidos. Das prisões preventivas, como ferramenta de tortura para se obter delações, a vazamentos seletivos à imprensa, para antecipar a condenação dos denunciados mesmo que venham a ser absolvidos pela história. O relógio da operação moveu-se no compasso eleitoral. Em 2014, às vésperas da eleição presidencial, a dobradinha com revistas e emissoras encurtou a poucos dias do segundo turno uma ampla distância entre Dilma Rousseff e Aécio Neves. Àquela altura, já haviam sido eleitos os deputados e senadores que compuseram o Congresso mais conservador desde a ditadura.
Depois do seletivo massacre à esquerda, a classe política alojada no PMDB, PSDB, DEM e aliados de ocasião reassumiu o poder. E segue irrigando a mídia com mais “repasses” do que nunca. Para quem achava que o golpe se esgotava “apenas” em Dilma e Lula, veio a nova fase, e sua razão de ser: começar a destruir todo resquício de Estado indutor de desenvolvimento com distribuição de renda. A Petrobras não interessará mais aos brasileiros – só aos estrangeiros. Ataques a direitos como aposentadoria, empregos, saúde e educação, a programas sociais e ao meio ambiente só estão começando.
A Constituição de 1988, que custou dois anos de intensos debates para ser escrita e mais de duas décadas para que seu lado “cidadã” pudesse ser mais sentido, pode virar pó. Ou trabalhadores e movimentos sociais organizam fileiras para reagir – e como já foi dito aqui são batalhas políticas, jurídicas, nas ruas e de comunicação – ou passará a viger apenas a lei em que para o mercado vale tudo. A vida das pessoas não virá ao caso.