Perdemos a eleição. Minha cabeça e meu coração teimam em me deixar muito confuso. Eu não estou triste! Estou muito preocupado, mas não estou triste! Talvez seja um dos aprendizados dos anos e do testemunho de muitas vitórias e derrotas no curso de tantas lutas que encarei.
Chorei quando a emenda das diretas foi derrotada e sorri quando Tancredo foi eleito presidente; festejei a promulgação da Constituição de 88 e me deprimi com a eleição de Collor; explodi de alegria quando Lula ganhou a eleição e sangrei com o golpe da derrubada de Dilma; me alegrei com o primeiro turno, mas agora experimento o gosto amargo da derrota eleitoral.
São as idas e vindas da democracia, este modo imperfeito de relação sócio-política e de gestão dos conflitos públicos com o qual me uni indissoluvelmente desde muito cedo. Celebrar vitórias e chorar derrotas tem sido um incessante fluxo ao longo da minha vida de militante por liberdade, democracia, justiça social, universalização de direitos fundamentais e dignidade na vida de todos os brasileiros.
Pois acho que é o fato de ter sido derrotado lutando por este mesmo ideário, de ter sido derrotado de mãos dadas com estes compromissos que abracei desde os anos setenta e com os sonhos que desde então alimento, que faz com que eu não esteja triste. Estou apenas com medo e muito preocupado com o que nos ocorrerá nos próximos quatro anos, mas não sinto nenhuma tristeza.
Os vitoriosos, sim, estes devem ficar tristes e envergonhados. A sua vitória não foi embalada por nenhum grande sonho, nenhuma grande utopia, nenhum grande projeto de emancipação e justiça para a imensa maioria da população brasileira que vive na pobreza e nas bordas da miséria; sequer foi alimentada por um grande projeto para fazer do Brasil um país que se insira com altivez no concerto mundial das grandes nações civilizadas. A vitória deles foi a vitória da negação, da destruição do legado dos últimos anos, da perseguição aos gays, negros, pobres, índios, quilombolas, movimentos sociais, à esquerda; foi a vitória do ódio, da violência, da tortura e do assassinato. Foi a vitória da repressão contra a liberdade; das armas contra a arte; das balas contra os livros; dos policiais contra os artistas e os intelectuais. Foi enfim a vitória da pulsão de morte e dos mais baixos instintos que habitam o ser humano; ganharam em oposição à ciência, ao conhecimento, à pesquisa, à proteção do ambiente e à produção cultural.
Então, eu não posso estar triste, não posso ficar desanimado. Vi crescer nos últimos dias uma onda de mentes, de mãos, de braços e de corações pela democracia, pela liberdade, pelos direitos humanos, pela preservação dos avanços e pela luta pra realizarmos os nossos sonhos de um país mais justo e com dignidade para todos. Estou muito preocupado e sinto medo do que virá, mas sinto também imensa e renovada disposição para lutar. Mais uma vez, o futuro é a luta!
Jéferson Muricy