O primeiro diz respeito aos avanços e recuos em decisões sobre a montagem do futuro governo, despertando o receio de que não apenas agora, antes da posse, seu estilo decisório seja errático.
O segundo continua sendo sobre a capacidade operacional de seu governo na política, na construção da agenda e da maioria parlamentar. Ontem, a oposição barrou a Medida Provisória 844, marco para a privatização do saneamento, que devia ter despertado o interesse do futuro governo tão privatista.
Bolsonaro anunciou pessoalmente ontem o recuo em relação à extinção do Ministério do Trabalho, que segundo informação anterior, teria suas atribuições absorvidas por outras pastas.
Sem explicar porque mudou de ideia, ele assegurou que o ministério continuará tendo existência própria, o que é um acerto, pois seu esquartejamento seria prejudicial a muitas atividades e políticas públicas, em fase de desemprego elevado.
Agora, o Trabalho é que absorverá atribuições de outras pastas, que não foram identificadas.
Ele mesmo anunciou também que o ensino superior não será transferido do MEC para o Ministério de Ciência e Tecnologia, como chegou a ser cogitado, embora não anunciado tão peremptoriamente como foi o caso do Trabalho.
Custa a crer que os anúncios são feitos de forma irrefletida, sem prévia e acurada avaliação das consequências das decisões.
Custa a crer que só depois das reações negativas a equipe do presidente eleito se dê conta dos inconvenientes.
Os recuos geram o receio de que o futuro governo seja tão errante quando este ensaio geral que está sendo a sua montagem.
“Não creio que seja incapacidade ou incompetência. Pode ser um diversionismo proposital para tirar a atenção da verdadeira pauta política que eles defendem… Essas idas e vindas, esses ditos e desditos podem ser uma cortina de fumaça para desviar atenções”, dizia ontem a senadora Vanessa Graziottin (PCdoB-AM).
Seja o que for, não está fazendo bem ao futuro governo.
Em relação ao Congresso e à agenda parlamentar, nada se aprendeu com a aprovação do aumento do Judiciário na semana passada.
Ontem, após a governadora eleita do Rio Grande do Norte, senadora Fátima Bezerra (PT), ler uma carta dos atuais e futuros governadores, a oposição barrou a aprovação da MP 844, que lança bases para a privatização do saneamento.
Nem o atual nem o futuro governo, que tem grandes ambições privatistas, se mexeram.
E pelo andar da carruagem, não será também aprovada, pelo Senado, a proposta que autoriza a Petrobras a vender 70% de suas reservas do pré-sal decorrente da cessão onerosa.
Ou pode também acontecer e a oposição aprovar a emenda que tira dos recursos da União R$ 100 milhões para os estados e municípios.
Neste ritmo, o futuro governo assistirá passivo à consolidação de candidaturas às presidências do Senado e da Câmara.
Militar na Defesa
Apesar das reconhecidas qualidades do general Fernando Azevedo e Silva, sua indicação para o Ministério da Defesa não deixa de ser um retrocesso.
A tradição de nomear um civil, observada desde a criação da pasta em 1999, foi quebrada por Temer e agora continuada por Bolsonaro. A Marinha teria ficado frustrada porque esperava emplacar um almirante. A escolha de um não-militar, além de reforçar o poder civil, evita estas disputas.
Mas Bolsonaro, com a escolha, pode ter buscado exatamente reforçar a associação de seu governo às Forças Armadas, após o comandante do Exército, general Villas Bôas, ter dito que ele não representará a volta dos militares ao poder.
Mau gosto
Dispensa comentários a afirmação de Bolsonaro de que o futuro chanceler será de carreira, podendo ser homem, mulher ou gay. O embaixador Luís Fernando Serra continua sendo o mais cotado.